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BIOTECNOLOGIA
Nova molécula obtida na Alemanha a partir de micróbios alterados geneticamente pode ter usos médicos
Bactérias fabricam plástico biodegradável
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
O futuro das fábricas de plástico
sugerido pelas pesquisas de um
grupo de cientistas alemães pode
ser bem tenebroso: a maioria dos
trabalhadores trabalharia dia e
noite, ininterruptamente, sem direito a salário e recebendo apenas
o mínimo necessário à sobrevivência. Pobres bactérias.
Uma breve amostra desse futuro está publicada na última edição
da revista britânica "Nature Materials" (materials.nature.com).
Nela, a equipe liderada por Alexander Steinbüchel, da Universidade de Münster, relata os detalhes de um experimento que colocou micróbios para trabalhar na
fabricação de uma classe específica de polímero, biodegradável.
A categoria sintetizada pelas
bactérias é a dos politioésteres,
mas antes que ouvissem alguém
perguntando "poli tio de quem?",
os pesquisadores preferiram
abreviar e chamar esses compostos de PTEs. "A publicação descreve a primeira biossíntese bem-sucedida dessas moléculas", afirma Tina Lükte-Eversloh, primeira autora do estudo.
Os PTEs são um dos vários tipos
de polímero -moléculas gigantescas compostas por cadeias repetitivas baseadas em átomos de
carbono- que podem ser usados
na fabricação de materiais plásticos. Existe uma crescente busca
entre as indústrias por métodos
de obtenção de materiais com essas propriedades que sejam menos agressivos ao ambiente.
Atualmente, esses compostos
são obtidos a partir do processamento de petróleo -não exatamente a substância mais amigável
ao ambiente. Além de seus derivados poderem voltar à atmosfera
acentuando os efeitos do aquecimento global, a grande maioria
dos materiais plásticos produzidos a partir do petróleo não são
biodegradáveis. Ou seja, a natureza é incapaz de assimilá-los novamente, impedindo que as substâncias participem de um ciclo
equilibrado de uso e descarte.
Idéia antiga
Polímeros fabricados por bactéria não são uma grande novidade.
Alguns deles, conhecidos como
PHAs (ou polihidroxialcanoatos,
para quem prefere nomes estranhos e difíceis de ler), já foram fabricados a partir da manipulação
do metabolismo de bactérias para
transformá-las em "biofábricas".
"A síntese bacteriana de polímeros termoplásticos é conhecida há décadas", diz Lütke-Eversloh. "No nosso caso, queríamos
achar caminhos alternativos para
biossíntese de novos polímeros."
Esses novos métodos poderiam
oferecer a alternativa ideal para a
obtenção desses produtos. Mas
ainda falta muito até que seja possível tornar essa biotecnologia comercialmente competitiva.
"Hoje em dia, polímeros bacterianos não competem comercialmente com polímeros produzidos petroquimicamente. Mas a
academia e a indústria têm explorado a possibilidade de produzi-los por fermentação microbiana e
por uso de plantas transgênicas",
diz Lükte-Eversloh. "Acho que isso vai ser importante, considerando os decrescentes recursos petrolíferos e o senso humano de
responsabilidade pela natureza."
Micróbio predileto
Para obter os PTEs, os pesquisadores utilizaram uma versão modificada geneticamente da Escherichia coli. Para o azar dela, trata-se de uma das bactérias favoritas
dos cientistas para experimentos.
As ditas cujas receberam um conjunto de genes projetado artificialmente para dar à bactéria as
informações necessárias para que
ela sintetizasse os compostos procurados. E os resultados foram
bastante animadores.
"No começo, ficamos impressionados pela falta de especificidade das enzimas [proteínas que
estimulam as reações] envolvidas", conta a pesquisadora. "Mas
funciona. E é notável que esse seja
um caminho de biossíntese não-natural, demonstrando o potencial de técnicas moleculares para a
engenharia de metabolismo."
De acordo com os pesquisadores, as potenciais aplicações dos
novos PTEs ainda estão para ser
descobertas. Mas elas são como as
proverbiais bruxas -que existem, existem. "PTEs são materiais
interessantes para aplicações especializadas", afirma Lükte-Eversloh. "Usos médicos de politioésteres como biomateriais implantáveis podem ser possíveis,
considerando por exemplo as
propriedades antimicrobianas do
enxofre. Entretanto, agora, só podemos especular -a utilidade
desses novos biopolímeros precisa ser investigada."
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