São Paulo, quarta, 24 de março de 1999

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CIÊNCIA
Estudo com ratos sugere localização precisa de região do cérebro que guia o armazenamento de informações
Pesquisa desvenda a perda de memória

MARCELO FERRONI
da Reportagem Local

Cientistas dos EUA anunciaram que estão a um passo de desvendar o processo de armazenamento de informações pelo cérebro e também a forma como ele falha, isto é, como se dá a perda de memória.
O estudo, realizado em ratos, procurou entender como funciona e onde se localiza a produção da memória de longo prazo, ou seja, dos dados que permanecem por mais tempo no cérebro.
O entendimento do processo pode fazer com que sejam solucionados problemas como a amnésia.
"Nós procuramos entender os fatores essenciais que se perdem quando há uma lesão no cérebro e como esse conhecimento poderia ajudar a desenvolver novos métodos terapêuticos", disse Cristina Alberini, da Universidade Brown, em Rhode Island, EUA, em entrevista por e-mail à Folha.
O estudo, conduzido por Alberini, será publicado em abril na revista "Nature Neuroscience". Ela e sua equipe estudaram ratos normais e ratos com lesões na região do fórnix, que liga o hipocampo -região relacionada à memória- a outras partes do cérebro.
Os ratos foram treinados para escolher entre um compartimento escuro e um claro. Quando entravam no local escuro, recebiam choque elétrico nas patas.
Dessa forma, os ratos normais adquiriram uma memória e passaram a escolher apenas o compartimento claro. Os ratos com lesão no fórnix, no entanto, logo se esqueciam dos choques e voltavam a entrar na área escura.
Em seguida, os pesquisadores procuraram examinar as mudanças bioquímicas que ocorriam no hipocampo durante o processo.
Em ratos normais, houve um aumento na modificação química de uma proteína chamada Creb. O processo, chamado fosforilação, não ocorria nos ratos com lesões no fórnix.
Os resultados, segundo os pesquisadores, indicam que a fosforilação no hipocampo pode ser um passo importante para a transformação da memória de curto prazo para uma de longo prazo.
"A novidade do estudo pode estar na identificação do local exato em que ocorre esse processo", disse Ademir Baptista Silva, professor de neurofisiologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Segundo Silva, estudos anteriores já haviam indicado a importância da Creb na formação da memória. Os resultados, no entanto, partiram do estudo de um animal invertebrado marinho, o Aplysia californica, com o sistema nervoso muito mais simples que o de ratos.
Quando o Creb é modificado, ele ativa duas outras proteínas. Uma delas armazena dados da memória e a outra promove o aumento de ligações entre as células nervosas, o que aumenta a capacidade de armazenamento do cérebro.
A ativação do Creb ocorre no hipocampo, mas a formação das proteínas que armazenam dados sobre um fato ocorre em diversas partes do cérebro.
"Quando a memória grava o conceito de mesa, por exemplo, o formato da mesa, sua cor e seu material são armazenados em partes diferentes do cérebro", afirmou Silva.
"Ao nos lembrarmos de uma mesa, diferentes regiões do cérebro são acionadas para trazer sua imagem à lembrança."



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