São Paulo, sábado, 24 de abril de 2010

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Haila, 6, não entende noção de propriedade

Marcelo Justo/Folha Imagem
Haila Baldin Fernandes Inácio, 6, portadora da síndrome de Williams que vive em Valinhos


DO ENVIADO A VALINHOS

Pobre da gata Cristal. Quando Haila, 6 anos, corre atrás dela, abraça a felina com tanta força que chega a deixá-la sem fôlego. Lembra a Felícia, personagem de desenho animado que queria "apertar e amar para toda a vida" os animais que apareciam na sua frente.
Não é só com a gata que Haila simpatiza, porém. Quando a mãe, Ana Carolina Baldin, a leva ao shopping ou ao supermercado, não há uma pessoa que não receba um "oi, tudo bem?" da menina. Ela gosta especialmente de idosos. Nada de racismo: ela fica entusiasmada quando vê negros -talvez por achá-los diferentes de si mesma e da família. "Ela ama senhores negros de cabelo branco, quer puxar, abraçar, sentar no colo", diz a mãe.
É típico da síndrome de Williams não sentir receio de estranhos. Por mais querida que possa ser uma criança que não tem grandes restrições à socialização -é cativante quando a menina segura as visitas querendo evitar que elas deixem a casa-, isso faz com que a mãe acabe tendo um trabalho danado para cuidar dela.
Não é difícil de entender. Mesmo que um rottweiler esteja latindo bravo, a garota quer ir abraçar e beijar o bicho. Diferentemente de crianças que se escondem atrás dos pais quando cercadas de estranhos, não é preciso muito para que Haila desapareça no meio da multidão quando a mãe se distrai. "É difícil, por exemplo, num lugar como uma loja de departamentos, cheio de CDs, DVDs, brinquedos, chocolates, um monte de coisas que chamam a atenção da Haila. Qualquer desatenção é perigosa", afirma ela.

Mapa na cabeça
Por isso, Baldin acabou, diz, tornando-se especialista em mapear ambientes. "Ao entrar em uma loja, já reparo onde estão as saídas. Caso a Haila suma, consigo ter certeza de que ela não vai sair de lá", diz.
Haila adora passear de carro e já foi pega entrando em automóveis parados na rua, mesmo de desconhecidos. Não se sabe quem levou o susto maior: a mãe, quando percebeu que ela tinha sumido, ou o sujeito que, ao dar partida no veículo, percebeu estar acompanhado de uma criança empolgada.
A menina frequenta a Apae de Valinhos (SP), onde mora, e uma escola, onde convive com crianças sem necessidades especiais. Haila é bastante querida, e Baldin sempre escuta das mães dos colegas que os seus filhos só falam nela. Não para de mencionar o nome de um amigo da Apae que tem síndrome de Down. O único porém é que ela não entende bem a noção de propriedade, e alguns colegas não gostam muito quando ela mexe nos seus brinquedos.
Se, por um lado, é bom que ela não seja uma menina possessiva, por outro, diz a mãe, é importante que ela aprenda a não beber o refrigerante dos outros, por exemplo. Coca-Cola, aliás, é uma das paixões da menina, além de música.
Começou com a turma do "Cocoricó", aquela da TV Cultura, nos primeiros anos de vida. Em seguida, vieram os "Backyardigans", do Discovery Kids. Agora, a moda é um DVD da Xuxa ("Xuxa Festa") que faz os "baixinhos" mais antigos se sentirem velhos: "Ilariê" foi remixada, recebendo uma modernosa guitarra. Haila adora.
A paixão por música também é uma constante entre crianças com Williams. O ânimo de Haila para cantar e dançar o tempo todo parece não ter fim -assim como a sua sensibilidade.
Haila chora fácil quando quando escuta uma música triste, afirma a mãe da menina. Por ser muito musical, fica bastante incomodada com sons irritantes. Ao longo dos anos, porém, a menina parece estar se adaptando a eles, diz a mãe. Ela não apresentou, até hoje, grandes problemas físicos relacionados à síndrome. (RM)


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