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56ª SBPC
Sírio-Libanês, em São Paulo, controla tumor em 17 pacientes com técnica experimental que usa laser e oxigênio reativo
Hospital trata câncer com luz e corantes
SALVADOR NOGUEIRA
ENVIADO ESPECIAL A CUIABÁ
A julgar pelo nome, parece tratamento médico de ficção científica, ou pior, mandinga de charlatões: terapia fotodinâmica. Mas
um estudo conduzido no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo,
sugere que talvez essa nova forma
de tratar certos tumores possa
conduzir a resultados positivos.
Embora a técnica de tratamento
do câncer não seja propriamente
inédita, são poucos no mundo os
esforços devidamente reportados
de verificar sua eficácia. O estudo
paulista, realizado com 20 pacientes, obteve resultados promissores, segundo o médico Orlando
Parise Júnior, coordenador da
pesquisa. "Eu sou um entusiasta
da PDT [sigla em inglês para "terapia fotodinâmica"], mas ainda
não dá para dizer, com tudo que
foi publicado, que ela seja uma estratégia melhor do que outras para combater a doença."
O médico apresentou o trabalho
na 56ª Reunião Anual da SBPC,
que acabou ontem em Cuiabá
(MT). A sigla designa a instituição
que agora leva o nome de Associação Brasileira para o Progresso
da Ciência. A troca, feita durante a
assembléia-geral dos membros,
ocorreu por razões legais -"sociedade", pelo Novo Código Civil,
só pode designar instituições com
fins lucrativos.
A idéia por trás da terapia fotodinâmica é combinar três elementos para induzir seletivamente as células à morte. Em primeiro
lugar, usa-se um corante fotorreativo, ou seja, que reage à presença
de luz, e faz-se com que ele seja
absorvido pelas células.
Quando isso ocorre, o tecido é
exposto à luz. No processo, surge
o tal terceiro elemento -uma
molécula de oxigênio altamente
reativa, conhecida como "oxigênio singlete". Uma vez produzida,
ela tem um tempo de vida extremamente curto, da ordem de milésimos de milésimos de segundo.
Curto, mas suficiente para reagir
com partes das células, sobretudo
mitocôndrias, organelas responsáveis pela produção de energia.
Destruição
O estrago causado pela ação do
dito singlete é radical. Ele oxida
partes da célula e faz com que ela
se desenvolva de dois possíveis
modos: necrose -pura e simplesmente a destruição e morte
do tecido- ou apoptose -o suicídio celular, normalmente cometido por células que interrompem
seu funcionamento normal.
Teoricamente, esse efeito ocorreria com todas as células que tivessem absorvido o corante. Mas
aí é que vem o pulo do gato: sabe-se que, em geral, as células sadias
se livram muito mais rápido da
substância do que as cancerosas.
"Essa é a janela para você atuar",
diz Parise Júnior. Atacando com
luz no momento certo -quando
só células do tumor estão com a
substância-, é possível atingir
apenas tecidos desejados.
Há dificuldades, entretanto. Em
primeiro lugar, a literatura médica ainda é pobre para definir quão
eficaz é o tratamento. Em segundo, nem sempre é possível fazer a
mágica no tumor -é preciso fazer a luz chegar até ele, o que impede o acesso a tecidos mais profundos do organismo.
Os casos mais indicados para
uso da técnica acabam sendo os
cânceres de pele, cabeça e pescoço, onde os danos muitas vezes
são mais superficiais.
Como fonte de luz, os médicos
usam um laser vermelho -cor
do espectro visível que consegue
penetrar mais profundamente os
tecidos. O equipamento usado
pela equipe do Sírio-Libanês foi
importado para a aplicação. "Poderíamos ter chamado o Ipen, o
pessoal da USP e ter desenvolvido
tudo aqui, mas isso ia levar muitos anos", diz. "Há muitos pacientes que não podem se dar ao luxo
de esperar o tempo que leva para
fazer um doutorado."
No caso dos testes feitos no Sírio-Libanês, 17 dos pacientes se
recuperaram bem da doença, ou a
mantiveram sob controle.
Por ora, a PDT não vai substituir nenhuma das técnicas consagradas atualmente para o combate a tumores, como cirurgias de
extração, radioterapia e quimioterapia. Na melhor das hipóteses,
ela será usada como método paliativo e/ou de controle da doença, provavelmente em conjunto
com outros esforços paralelos no
combate ao tumor.
Mas Parise Júnior vê com otimismo as possibilidades do tratamento. "É uma nova forma de
tratamento e até diagnóstico do
câncer. As aplicações médicas
ainda estão engatinhando."
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