São Paulo, domingo, 26 de maio de 2002

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Periscópio

Esquizofrenia e PET

José Reis
especial para a Folha

Dois pesquisadores médicos, um norte-americano e outro alemão, publicaram na revista "Nature" suas experiências com a esquizofrenia paranóide utilizando o imageamento pela PET (tomografia por emissão de pósitrons). Concluíram ser possível por esse meio delimitar a área geradora das alucinações e modelar os remédios contra a doença.
A PET é dispositivo não-invasivo que permite fotografar e analisar com grande precisão e sensibilidade a atividade das estruturas do corpo, inclusive os circuitos vasculares e nervosos. Baseia-se na ação de pósitrons, que são elétrons positivos. Ela tem concorrido vantajosamente, em certas circunstâncias, com outros recursos de varredura ou esquadrinhamento estrutural.
As esquizofrenias são um grupo de doenças caracterizadas por alterações ideoafetivas, segundo ensina Isaac Mielnik em seu dicionário de termos psiquiátricos. A American Association of Psychiatry define a esquizofrenia como grave distúrbio emocional de nível psicótico profundo, caracterizado por fuga à realidade com produção de delírios, alucinações, desarmonia e conduta agressiva. O nome esquizofrenia foi criado por Eugen Bleuler em 1911, embora o reconhecimento do mal, sob várias denominações, seja muito mais antigo. A palavra significa cisão mental.
Um dos tipos de esquizofrenia é a paranóide, que configura pensamento autista ou paralógico, delírios de referência, perseguição ou grandeza, mal sistematizados e acompanhados de alucinações. Um dos pacientes estudados no trabalho publicado na "Nature" era moço de 25 anos, que se dizia perseguido por voz ameaçadora que lhe dirigia palavras irreverentes de acusação ou censura, ou procurava orientar-lhe a conduta.
Os pacientes eram deitados em quartos isolados, onde eles apertavam um botão da PET sempre que ouviam as palavras. Com essa operação, "acendiam" as áreas cerebrais supostamente atingidas, que os cientistas fotografavam de dez em dez minutos e, mais tarde, comparavam e casavam com o ruído do botão. Conseguiram, afinal, verdadeiro álbum fotográfico de alucinações ativas.
O resultado do trabalho foi excelente, conseguindo os cientistas localizar circuitos cerebrais que parecem controlar as alucinações auditivas provenientes da doença. A identificação das áreas de alucinação talvez permita compor os fármacos ativos desses locais e curativos do processo.
Sugerem ainda os resultados obtidos que as alucinações sejam produto conjunto das estruturas cerebrais profundas que regulam o pensamento e as emoções e das áreas superficiais associadas aos sinais sonoros e visuais. Integrando vozes e visões aleatórias com emoções, o cérebro pode dar agudo senso de realidade a esse tipo de estímulo. Segundo lembra Jeannifer Mattos em "Time", os achados se contrapõem à idéia de que os pacientes com alucinações na verdade estejam falando consigo mesmos, pois as varreduras do cérebro pela PET revelam atividade na área correspondente à audição, porém não nas relativas à fala.


Esta é a última coluna de José Reis. Ela foi enviada à Folha na primeira quinzena de maio

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