São Paulo, domingo, 28 de abril de 2002

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Periscópio

Gene do glaucoma

José Reis
especial para a Folha

Segundo Gretchen Vogel ("Science", 275, 621), o glaucoma é uma doença insidiosa. Ele pode destruir gradualmente e sem dor a visão periférica e irreversivelmente o olho antes de ser detectado. Aparentemente ele é causado quando a pressão intraocular sobe, lesando o nervo ótico. Mas ignora-se o que exatamente provoca esse fenômeno.
Segundo um relatório publicado pela OMS (Organização Mundial da Saúde), com dados de 1997, o glaucoma é responsável por 15% dos cerca de 45 milhões de casos de cegueira no mundo. Só perde para a catarata (que responde por nada menos que 43% dos casos) e para degeneração macular, retinopatia provocada por diabetes e doença do nervo óptico (24% dos casos, somadas).
Recentes pesquisas parecem conduzir à melhor compreensão da bioquímica da moléstia e à possibilidade de diagnóstico precoce. Na página 668 da mesma revista, Edwin Stone e Val Sheffield, do Iowa College of Medicine, nos Estados Unidos, com colegas de seis outras instituições, descrevem a identificação do gene defeituoso em casos de glaucoma juvenil, forma agressiva do mal, que ataca especialmente na juventude.
A descoberta mobilizou especialistas para descobrir como poderia o glaucoma ser produzido pela proteína correspondente ao gene (TIGR), a qual é feita por células que ajudam a controlar a pressão ocular -pressão do líquido contido no interior do globo ocular. Mais importante, porém, é permitir a descoberta fazer o diagnóstico precoce da doença, o que é muito difícil, especialmente em seus primeiros momentos.
Jogando com estatísticas norte-americanas, Vogel calcula os registros de glaucoma juvenil em menos de 1% de todos os casos. Esse número, somado às mutações, permite calcular que é possível avaliar em 100 mil o número de pessoas que nos Estados Unidos poderiam ter a doença sem saber e, assim, arriscar a perda da visão. Essas pessoas podem então ser tratadas por drogas.
Um gene é um pedaço de DNA (ácido desoxirribonucléico) que carrega o código para a produção de uma proteína específica pelo maquinário da célula. As proteínas, por sua vez, são as moléculas que realizam as tarefas no organismo.
Na identificação do gene, os especialistas de Iowa valeram-se do atlas do Genoma Humano -o conjunto de genes da espécie, decifrado por um consórcio público internacional, o PGH (Projeto Genoma Humano), e por uma empresa privada, a Celera, que usou um método de sequenciamento distinto do usado pelo PGH para obter seus resultados.
Os efeitos do gene podem não ser limitados às famílias de glaucoma juvenil, mas ocorrer também em adultos. Há pacientes que não exibem o gene TIGR ou suas mutações. Os cientistas estão à procura desses outros genes. E já conseguiram algum resultado. Mas enquanto outros genes não forem confirmados, o TIGR será a única pista para desvendar os mecanismos envolvidos na doença.



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