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São Paulo, quinta-feira, 29 de maio de 2003

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NEUROLOGIA

Cérebro de jogadores processa mais rapidamente maior número de estímulos à visão, diz pesquisa americana

Jogar videogame amplia habilidade visual

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Possível cena do cotidiano no fim do século 21: o menino quer sair para jogar bola, e a vovó, preocupada, tenta dissuadi-lo. "Lá você pode se machucar. E, lembre-se, filho: videogame faz bem para a vista." Segundo uma dupla de cientistas, isso pode não estar muito longe da verdade.
Eles sugerem que jogos eletrônicos possam intensificar o grau de atenção visual -idéia que, intuitivamente, não parece surpreendente, mas que agora saiu do âmbito das impressões e virou ciência oficial, graças a experimentos feitos nos EUA.
Os resultados dos testes, publicados hoje na revista científica "Nature" (www.nature.com), sugerem que um jogador de videogames de ação tem a habilidade de perceber mais objetos em seu campo visual e de fazê-lo mais depressa do que um não-jogador.
"Jogadores podem processar informação visual mais rapidamente e podem acompanhar 30% mais objetos do que não-jogadores", diz Daphne Bavelier, do Departamento de Ciências Cognitivas e do Cérebro da Universidade de Rochester, nos EUA.
Ela fez os testes em conjunto com um aluno seu, Shawn Green. Embora não seja uma jogadora ávida, o mesmo não se pode dizer de Green. "Ele é. E foi assim que tudo começou", conta.
Depois de se surpreenderem com a eficiência com que Green respondia aos testes visuais que eles estavam elaborando, a dupla decidiu verificar se a prática do videogame era a causa. Em testes que envolviam a tarefa de apontar em que ponto de uma tela surgia um objeto que só era visível por menos de um centésimo de segundo, jogadores se saíram melhor que não-jogadores. Os mesmos resultados surgiram quando a tarefa era dizer quantos objetos apareciam ao mesmo tempo.
Até aí, poderia não haver uma relação direta de causa e efeito -os jogadores podiam simplesmente ter uma habilidade inata e até por isso ser aficcionados por videogames.
A prova dos noves foi um experimento que colocava não-jogadores para jogar. Seus resultados iniciais nos testes eram decepcionantes, mas, após algumas horas de jogo, sua habilidade visual já começava a dar francos sinais de melhora. A dupla diz que dez horas acumuladas (não-ininterruptas) já trazem progresso.
Nem por isso os dois têm por bandeira a defesa dos violentos jogos eletrônicos de ação. "Certamente não queremos dizer que as crianças deviam jogar videogame em vez de fazer a lição de casa", diz Bavelier. "Além disso, o tipo de atenção visual melhorada que notamos é útil na vida real, como ao dirigir, mas pode ser contrabalançado pela agressividade que alguns jogos podem promover. Então, não podemos dizer com certeza que jogar videogames faz você dirigir com mais segurança."
Apesar disso, a dupla sugere que videogames especialmente projetados possam no futuro ajudar como terapias para doenças que envolvem déficit de atenção a estímulos visuais, como em pacientes vitimados por derrame.
Diversos problemas podem emergir da prática de videogames. Além da violência (que pode ou não induzir comportamento agressivo -alguns estudos sugerem essa tendência), esforço repetitivo pode danificar ligamentos. Há ainda um componente viciante perigoso. Em outubro do ano passado, dois jovens coreanos morreram de tanto jogar videogame (por exaustão, após 86 horas e 32 horas de jogo ininterrupto).


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