São Paulo, quinta-feira, 29 de maio de 2008

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Ressalvas tornam a lei inaplicável, dizem cientistas

Após a sessão de ontem do Supremo, opositor do uso de embriões em pesquisas disse que o placar é pela liberação

Exigências de Menezes Direito para aprovação incluem cláusula que veda destruição de embrião, mas não proíbe as pesquisas

LAURA CAPRIGLIONE
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

Se o voto de Carlos Alberto Menezes Direito for seguido e a Lei de Biossegurança for declarada constitucional com ressalvas, a pesquisa acabará na prática impedida. A opinião é de juristas e cientistas que foram ouvidos pela Folha. No entanto, isso não deve acontecer.
"Pelo placar de hoje, a questão está definida. A linha geral é pela liberação das pesquisas", afirmou após a sessão no STF Jaime Lopes, coordenador do movimento Brasil Sem Aborto que se opõe ao uso de embriões em pesquisa. "Mas nossa luta continua", disse.
O outro lado da batalha se mostrou otimista. "O placar é favorável a nós", disse Gabriela Costa, representante do Movitae -movimento em defesa do uso dos embriões nas pesquisas- em Brasília. Ela afirma, no entanto, que as ressalvas inviabilizam a pesquisa.
É também o que pensa a geneticista Mayana Zatz, da USP, principalmente quanto à ressalva que limita o número de células que se pode utilizar de um embrião. Segundo ela, só há notícia de um grupo no mundo que conseguiu derivar linhagens de célula-tronco a partir desse número reduzido de células. Zatz, porém, disse ter saído com expectativa positiva.
O neurocientista Stevens Rehen, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), concorda que as ressalvas, na prática, impedem a pesquisa.
"Se um casal gera quatro embriões, por exemplo, [para fertilização in vitro] e o primeiro é implantado com sucesso, os demais dificilmente serão usados, apesar de serem viáveis", diz Rehen. Essa situação, pelos votos proferidos ontem na Corte, seria ilegal, caso a ressalva da inviabilidade dos embriões permaneça válida.
Sobre a necessidade de mais um órgão federal para aprovar as pesquisas com células-tronco embrionárias - hoje os comitês de ética em pesquisa decidem sobre isso-, Rehen declarou: "Respeito muito a posição dos ministros, mas um órgão a mais vai apenas aumentar a burocracia".
Sobre o fato de a legislação permitir o uso de células-tronco embrionárias sem a destruição do embrião, Rehen afirma que isso é tecnicamente complicado. "Apenas um único grupo conseguiu fazer isso até agora [nos EUA]. Não podemos definir a política de pesquisa científica de um país por um único caso". Para o pesquisador, é difícil dizer se isso será uma prática comum em breve.

Impedimento
"Seria mais honesto e mais correto se esses votos fossem pela inconstitucionalidade", disse José Afonso da Silva, constitucionalista e professor titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Segundo ele, os votos que consideraram a Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) "parcialmente procedente", impondo novas restrições ao uso em pesquisa das células-tronco embrionárias, acabam impedindo a aplicação da lei.
"A Lei de Biossegurança aprovada já é muito restritiva.
Ampliar ainda mais o leque de restrições é o mesmo que impedir a utilização das células-tronco embrionárias", avaliou.
André Ramos Tavares, professor de Direito constitucional da PUC-SP e diretor do Instituto Brasileiro de Estudos Constitucionais, disse que os votos pela parcial procedência da Adin podem ser entendidos como uma tentativa de salvar a lei. "Em vez de considerá-la inconstitucional e, portanto, condená-la em sua totalidade, esses ministros preferiram reduzir ou restringir o seu campo de ação, extraindo dela os pontos que consideram contrários à Constituição. A lei continuará em vigor, mas terá uma incidência menor." Segundo Tavares, votos pela procedência parcial manifestam uma "deferência ao Parlamento".


Com a Sucursal de Brasília

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