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RIO +10
Maior proposta do país na reunião corre risco de ser enfraquecida
Brasil pode recuar nas metas de de energia
ELIANE CANTANHÊDE
CLAUDIO ANGELO
ENVIADOS ESPECIAIS A JOHANNESBURGO
O Brasil estava ontem perto de
jogar a toalha na determinação de
excluir grandes hidrelétricas da
meta de 10% de energia renovável
para todos os países do mundo.
Essa meta é a principal proposta
nacional na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável
(Rio +10) e, para salvá-la, a delegação brasileira partiu para uma
espécie de vale-tudo.
"Se não incluirmos as hidrelétricas, fica praticamente impossível falar em meta de energia", afirmou o ministro do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho, ao admitir o recuo brasileiro. O secretário
de Estado de Meio Ambiente de
São Paulo, José Goldemberg, concorda, mas com ressalvas.
Principal autor da proposta, ele
defende que, caso as grandes hidrelétricas sejam incluídas, o texto final determine que isso só valerá para as que seguirem diretrizes ambientais internacionais.
A inclusão das hidrelétricas foi
uma proposta capitaneada pela
União Européia, com apoio da
Rússia, China e Índia, além de
países da África. O Brasil rejeitava
a inclusão, sob o argumento de
que, apesar de não produzirem
CO2, elas destroem ou danificam
os ecossistemas com inundações.
Além de negociar as hidrelétricas, o Brasil tenta também vencer
as fortes resistências dos árabes
produtores de petróleo à meta de
10%. O problema, portanto, deixa
de ser entre países ricos e pobres
para ser do próprio G-77, que reúne nações em desenvolvimento,
como o Brasil e os árabes.
"Estamos no fio da navalha",
disse ontem Carvalho, depois da
reunião sobre energia em que
muitos países radicalizaram posições. Ele conta, agora, com o
apoio da Venezuela para a cota,
apesar de esse país também produzir petróleo, como os árabes.
Para Carvalho, os árabes só estão preocupados com o próprio
bolso: "A meta significa menos
mercado de petróleo para eles,
que estão colocando a lógica mercadológica acima da questão ambiental". O ministro do Itamaraty
Everton Vargas, que participa ativamente das negociações, conversou ontem com um delegado
da Arábia Saudita, Khaled Abu-Leif, e não saiu animado: "Eles estão com instruções extremamente rígidas do governo".
Para Goldemberg, o Brasil deve
deixar a decisão final para os chefes de Estado, na próxima semana: "Minha impressão é de que estamos no começo do processo".
A estratégia de negociação se
transformou numa barganha: o
Brasil passou a jogar duro contra
a proposta sobre biodiversidade
atualmente na mesa, de fixar uma
meta de redução de perdas de espécies até 2010. Ela foi apresentada pela União Européia (UE).
Como a UE lidera o movimento
a favor dessa proposta, o Brasil
tenta dizer implicitamente o seguinte: ou temos apoio na negociação da meta de energia, ou seremos um empecilho poderoso
contra a de biodiversidade.
Repartição de benefícios
Outra barganha brasileira se dá
entre as metas de biodiversidade e
a confirmação do princípio da
"repartição de benefícios", pelo
qual países e comunidades locais
têm direito a parte do lucro de
empresas que desenvolvam produtos a partir de materiais genéticos colhidos em seus territórios.
"Como você vai se comprometer com metas sem a repartição de
benefícios?", provocou o ministro
do Meio Ambiente.
Ele também acusou os países ricos de fazerem "ouvido de mercador" para a proteção de conhecimentos tradicionais, que interessa sobretudo ao Brasil, porque
significa uma espécie de direito de
propriedade intelectual, ou de patentes, para sabedorias ancestrais.
A patente é um direito individual,
e o de conhecimentos tradicionais, coletivo.
O principal objetivo da delegação brasileira, agora, é conseguir
consenso no G-77, que reúne 130
países e está muito rachado, para
depois negociar com mais força
com os países desenvolvidos.
É por isso que os líderes da delegação brasileira vêm tendo reuniões com os de México, Venezuela, Equador, República Dominicana e outros. O pretexto é preparar a reunião de países com
megadiversidade do presidente
Fernando Henrique Cardoso com
os chefes de Estado, em Johannesburgo, como parte da Rio +10.
Os brasileiros distinguem a radicalização dos Estados Unidos e
da União Européia em relação à
meta de energia, por exemplo. Os
norte-americanos rejeitam as metas, quaisquer metas, por princípio. Eles são considerados "juridicistas", como diz o embaixador
Gelson Fonseca, e por isso rejeitam metas que depois possam ser
objeto de questionamento jurídico internacional.
Já a União Européia tem uma posição mais pragmática e pontual, contra cláusulas e itens específicos, como o da inclusão das hidrelétricas na meta de 10% de energia renovável.
O Reino Unido é tido como o grande aliado do Brasil. Seu vice-premiê, John Prescott, deveria ter um encontro com a cúpula da delegação brasileira à Rio +10 entre ontem e hoje, para um balanço da conferência até aqui.
O jornalista Claudio Angelo viajou a convite da BrasilConnects Cultura e Ecologia
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