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ARQUEOLOGIA
Escavações subaquáticas revelam navios afundados em estuário de Portugal e contradizem relato histórico
Brasileiro desfaz mito de viking português
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Eles não acharam nenhum tesouro de pirata, nem esmeraldas,
rubis ou moedas de ouro e prata.
Acharam vários pedaços de madeira e cordas apodrecendo, alguns em melhor estado. Mas a
equipe internacional de arqueólogos subaquáticos, incluindo brasileiros, que trabalhou na foz do
rio Arade, no sul de Portugal, já
pôde pelo menos sepultar um mito -o de que ali haveria um navio
viking naufragado.
Os brasileiros -Gilson Rambelli, Paulo Bava de Camargo e Flávio Rizzi, pesquisadores do Museu de Arqueologia e Etnologia
(MAE) da USP- acharam mesmo restos de um ou dois navios
antigos, possivelmente portugueses dos século 15 ou 16, da chamada tradição ibero-atlântica.
Eles encontraram uma quilha (a
espinha dorsal de uma embarcação) com quase quatro metros de
comprimento, e a ponta de uma
caverna, peça encaixada transversalmente à quilha que forma o esqueleto do navio.
Mesmo sem confirmar o relato
histórico feito por um cronista
árabe, no ano de 996, de que navios vikings teriam afundado a caminho de atacar a cidade de Silves, os arqueólogos puderam encontrar um tesouro de outro tipo:
a riqueza de artefatos de várias
origens ali depositados pelas sucessivas levas de ocupantes do
território português.
"O rio Arade foi a principal rota
de acesso a Silves desde a implantação dos estabelecimentos fenícios no Algarve", escrevem os três
brasileiros em artigo a ser publicado na revista do MAE.
Segundo os arqueólogos, "durante a escavação foram encontrados inúmeros fragmentos,
principalmente cerâmicos, que
vão desde ânforas romanas até
utensílios inteiros do século 16,
passando pela cerâmica árabe".
Entre as peças mais bem preservadas está um raro cadernal, uma
caixa achatada de madeira com
duas fendas, em cada uma das
quais há uma roldana móvel. O
cadernal poderia fazer parte do
sistema de cabos (cordas) que
sustentaria um dos mastros.
A escavação deste ano, realizada
em julho e agosto, foi organizada
pelo Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática do
Instituto Português de Arqueologia. Participaram arqueólogos e
estudantes de oito países.
A coordenação foi do arqueólogo português Francisco Alves, um
dos pioneiros na área em Portugal
e responsável pelos trabalhos no
galeão Nossa Senhora dos Mártires, cujos achados foram a atração
central do pavilhão de Portugal na
exposição internacional de Lisboa
em 1998, a Expo-98.
Rambelli, que coordenou a participação brasileira, está lançando
nesta semana o livro "Arqueologia Até Debaixo D'Água" (Editora
Maranta, São Paulo, 2002). O livro
é o primeiro no país a descrever
esse aspecto da arqueologia, em
geral associado negativamente
com a "caça a tesouros".
Rambelli mostra como o principal objetivo da arqueologia, tanto
em cima como embaixo d'água, é
a busca de conhecimento, não de
suvenires. O livro também busca
conscientizar os mergulhadores
sobre o patrimônio subaquático.
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