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Justiça ignora Lula e pune desmatadores
STJ muda julgamentos e obriga proprietários rurais a recomporem reserva legal, enquanto presidente posterga punição
Tribunal avalia que dono deve repor floresta, mesmo
tendo comprado a área já
devastada; ruralista tentará
anistia a derrubadas ilegais
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Enquanto o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva adia mais
uma vez o prazo para punir
produtores rurais que desmataram mais do que o permitido
por lei, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) vem mandando
recuperar a área entre 20% e
80% de vegetação nativa das
propriedades, de acordo com o
percentual em vigor na época
do registro da reserva legal.
A recente mudança nos julgamentos do STJ acirra os ânimos da bancada ruralista no
Congresso, que fará nova investida nesta semana contra o Código Florestal, para anistiar
desmatamentos irregulares
ocorridos até 2001 ou 2006.
O debate diz respeito à principal parcela da redução das
emissões de gases de efeito estufa definida pelo governo às
vésperas na conferência de Copenhague, que começa na próxima segunda-feira.
A redução do desmatamento
responde, sozinha, por um
quarto do corte das emissões
responsáveis pelo aquecimento
global daqui até 2020, prazo
que o Brasil se deu para cumprir a meta de corte de carbono.
De acordo com o mais recente
inventário oficial de emissões,
o uso do solo foi responsável
por quase 60% dos gases lançados na atmosfera em 2005.
"A anistia aos desmatadores
é o primeiro dos três grandes
pesadelos da meta", avalia Carlos Minc (Meio Ambiente). O
ministro aguarda até o dia 11
uma definição do presidente
Lula sobre o prazo do novo
adiamento do decreto que pune
crimes ambientais, como a falta
da chamada "averbação" da reserva legal, termo jurídico para
o registro em cartório da área
de vegetação nativa.
Pesquisa feita pela Folha nas
decisões do STJ mostra que,
até dez anos atrás, o tribunal
não obrigava proprietários rurais a recomporem a área de reserva legal. Mas o entendimento mudou, mesmo nos casos de
compra de terra já desmatada
anteriormente.
Em 2007, por exemplo, o
STJ mandou uma indústria de
açúcar do município de Jaboticabal (SP) recompor a vegetação nativa de 20% da propriedade. A Companhia Açucareira
São Geraldo alegou ter comprado as terras nos anos 1980
já desmatada. A ação falava até
em ataque ao direito de propriedade. Mas o tribunal decidiu que a obrigação de recompor a vegetação cabe ao proprietário das terras, independentemente de o desmatamento ter ocorrido ou não antes da
compra do imóvel.
"São raros os produtores que
averbam a reserva legal, talvez
até por uma questão de ignorância", disse o advogado da
empresa proprietária da terra,
Johannes Wiegerinck.
O ministro relator deste caso
no STJ, Herman Benjamin,
também é autor de outro voto
mais recente, que impediu um
proprietário rural de Porto Velho (RO) de se beneficiar do
percentual maior de desmatamento na Amazônia, que vigorou até 1996. Nesse ano, após
uma explosão da derrubada na
região, uma medida provisória
baixada pelo então presidente
Fernando Henrique Cardoso
aumentou de 50% para 80% a
reserva legal no bioma. Essa
MP foi reeditada várias vezes
até 2001 e corresponde à versão em vigor do Código Florestal (a lei original é de 1965).
"Tive mais três ações votadas
antes, em que foi reconhecido o
direito de desmatar 50%, mas o
entendimento mudou, essa
questão ambiental está mais
acirrada hoje", disse a advogada da ação, Chrystiane Muniz.
Há dois meses, o tribunal decidiu que vale o percentual em
vigor no momento do registro
da reserva legal.
O ministro Herman Benjamin confirma a mudança nos
julgamentos do STJ. "Como o
país vai garantir a meta de redução do desmatamento se pune um grêmio estudantil que
tira xerox de um livro com uma
pena maior do que quem desmata 100 mil hectares de vegetação nativa?", argumenta.
Levantamento feito pelo
Imazon (Instituto do Homem e
Meio Ambiente da Amazônia)
mostra que a Justiça raramente exige a reparação do dano
ambiental. Muitas vezes a punição se limita à compra de cestas básicas.
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