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Desmatamento aquece Amazônia em até 4C, diz Inpe
Estudo sugere que derrubada de mais de 40% da floresta muda o clima local, disparando o processo de savanização
Simulação em computador
mostrou que troca da mata por lavoura de soja pode
reduzir chuvas em até 24%
no verão no leste amazônico
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
Uma das perguntas que mais
tiram o sono dos estudiosos da
Amazônia é quanto desmatamento precisa ocorrer para que
o clima local mude. Pelo menos
para uma região da floresta,
cientistas brasileiros acreditam
já ter uma resposta: 40%.
Substituir esse total de mata
nativa por soja ou pasto pode
causar aumentos de temperatura de até 4C e uma redução
de até 24% nas chuvas durante
a estação seca na porção leste
do território amazônico.
A área em questão abarca Pará, Amapá, Roraima, Maranhão, Tocantins e um pedaço
do Amazonas. Trata-se da metade naturalmente mais seca
dos 5 milhões de quilômetros
quadrados da Amazônia Legal.
E também uma das mais desmatadas: de 18% a 20% das florestas ali já cederam lugar à
agropecuária, contra 15% da
média amazônica total.
A conclusão é de um estudo
feito pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais),
com participação de pesquisadores das universidades federais de Minas Gerais e de Viçosa. O trabalho, que será publicado em setembro no periódico
"Geophysical Research Letters", cruza pela primeira vez
modelos climáticos computacionais com cenários realistas
de desmatamento.
Ele aponta que, além do
aquecimento global, a destruição da floresta também pode
levar à chamada savanização,
processo no qual o clima quente e úmido típico da Amazônia
dá lugar a um clima quente e seco característico do cerrado.
Nesse clima, a vegetação densa
da floresta tropical não sobrevive -e cede lugar à savana.
O conceito de savanização foi
proposto em 2003 por Marcos
Oyama e Carlos Nobre, do Inpe. Com base em modelos que
uniam clima e vegetação, eles
estimaram que o aumento da
concentração de gases-estufa
poderia levar a floresta a um
novo "estado de equilíbrio".
Os cientistas sabiam que o
desmatamento também tem
potencial "savanizante". Isso
porque o clima na Amazônia
depende das árvores, que regulam a umidade e a quantidade
de luz solar que chega ao solo.
Quanto menos floresta, em tese, mais quente e seca será a região (veja quadro à direita).
Só que até agora uma questão
permanecia em aberto: quanto
de desmatamento provocaria
essa mudança de equilíbrio?
A pergunta era difícil de responder com os modelos usados
até então. "Eles eram aleatórios, alimentados ou com um
cenário extremo -de 100% de
desmatamento- ou com um
total que o pesquisador chutava", disse à Folha Gilvan Sampaio, climatologista do Inpe
que liderou o novo estudo.
Destruição gradual
Para atacar a questão, Sampaio e seus colegas usaram as
estimativas de desmatamento
produzidas pelo grupo de Britaldo Soares Filho, da UFMG
(www.csr.ufmg.br/simamazonia). "Esta é a primeira vez
que são utilizados cenários futuros de mudanças no uso da
terra que se baseiam no que
realmente vem ocorrendo na
Amazônia. Com isso, podemos
analisar como será o comportamento da chuva, temperatura etc. à medida que a Amazônia é gradualmente desmatada", diz o cientista do Inpe.
O modelo também tentou
capturar as diferenças de temperatura e precipitação causadas pela substituição da floresta por soja ou pasto, os dois
usos mais comuns (e lucrativos) da terra na região.
O que as simulações em computador mostram é que o clima
começa realmente a mudar
quando a taxa de desmatamento é maior do que 40%.
A redução mais grave no total de chuvas ocorre nos meses
de verão amazônico (junho, julho e agosto) e nas simulações
nas quais a mata é substituída
por soja. Segundo Sampaio, isso acontece porque o ciclo
anual da soja deixa o solo mais
claro, aumentando a incidência
de radiação solar.
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