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Quiabo, o tal

Com o uso do quiabo em pratos refinados, chefs de São Paulo e do Rio mostram que o desafio da moderna culinária brasileira mora em se conectar às raízes e às coisas simples do dia a dia

Renato Neto/Divulgação
Prato de quiabo em que as sementes se transformam num caviar vegetal, da chef Roberta Sudbrack
Prato de quiabo em que as sementes se transformam num caviar vegetal, da chef Roberta Sudbrack

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Mesmo figurando em pratos tradicionais da culinária brasileira, o quiabo sempre foi vítima de preconceito: porque ele baba, porque tem pelo, porque não é propriamente... assim... um galã.

Cheio de estilo e personalidade, ele finalmente dá a volta por cima. E agora pode ser visto (e saboreado) na companhia de ingredientes de peso, como o foie gras, brincando de ser caviar e até invadindo receitas francesas.

A chef Roberta Sudbrack, que foi cozinheira da Presidência da República no governo Fernando Henrique Cardoso por sete anos e que, no mês passado, entrou para a lista dos melhores restaurantes do mundo da revista inglesa "Restaurant", estuda o quiabo há tempos.

Ela usa as sementes, "escondidas" durante séculos, quase envergonhadas dentro do fruto verde e alongado, para preparar um caviar vegetal. "O quiabo é um ícone. Foi um dos primeiros ingredientes que escolhi para uma pesquisa mais profunda", conta.

Outro entusiasta do quiabo é o chef Alex Atala -considerado, na mesma lista, o quarto melhor do mundo.

Atala inventou o papel de quiabo. Simplificando muito, ele bate, no liquidificador, quiabo, pimenta, sal e glicose. Depois, esparrama a mistura em uma folha de silicone e leva ao forno.

O papel de quiabo é servido com quiabo salteado, caviar de quiabo e quiabo frito. Não à toa, o prato, servido no seu restaurante D.O.M., em São Paulo, recebeu o nome de "quiabo quiabo quiabo".

No Dalva e Dito, o chef serve ratatouille -o prato francês que, numa releitura "brasuca", virou ratatouille do sertão- feito com ingredientes inusitados, como quiabo, maxixe, banana-da-terra e manteiga de garrafa.

O uso de ingredientes brasileiros com sotaque francês virou moda quando chefs gauleses vieram para cá nas duas últimas décadas.

Um deles é Emmanuel Bassoleil, chef do Skye, no hotel Unique de São Paulo. Ele incorporou ingredientes nacionais aos seus pratos e diz que "hoje, as pessoas estão mais curiosas, abertas e preparadas para consumir produtos que há 20 anos nem pensariam em provar".

Ousadia não falta também ao chef Diego Belda, do restaurante Rothko, em São Paulo. Ele criou uma terrine de foie gras, quiabo e pequi. "Sempre gostei de quiabo, principalmente por causa das várias texturas e das possibilidades de leituras", diz.

VOLTA ÀS RAÍZES

Para a chef Roberta Sudbrack, o quiabo está ressurgindo. "A cozinha moderna brasileira não pode estar desconectada dessas raízes, das coisas simples do dia a dia."

Para ela, "ainda não chegamos nem perto de descobrir tudo o que esse ingrediente tem a nos oferecer".

No restaurante Xapuri, em MG, dona Nelsa defende que não é preciso mais que uma boa receita para conferir o potencial e o sabor do quiabo.

Ali, o quiabo verdinho recebe o tratamento "original". Ele é lavado com esmero, cortado em pedaços de quatro centímetros e levado à panela. O segredo dela? Respeitar o "jeito de ser" dele. "Deixe o quiabo quietinho, na dele. Se mexer, ele solta a baba." Questão de personalidade.

(JULIANA SAAD)

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