São Paulo, quinta-feira, 01 de março de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PASQUALE CIPRO NETO

"Homenagens literomusicais"

Escreve o leitor Pedro Pereira: "Embora tenha encontrado nos dicionários as palavras "literomania", "literomaníaco" e "literofobia", nos léxicos não achei a palavra "litero", utilizada no seu artigo publicado dia 25 de janeiro deste ano. Não será mais apropriado escrever "homenagens literárias e musicais'? De resto, o que vêm a ser "homenagens lítero-musicais" ou "homenagens literárias e musicais'?" Atenciosamente".
O leitor se refere a um texto em que mencionei "as várias homenagens lítero-musicais" de que a cidade de São Paulo já foi alvo.
É preciso começar com uma retificação gráfica: o adjetivo se grafa "literomusicais", sem hífen e, consequentemente, sem acento, e não como saiu naquela coluna ("lítero-musicais").
É normal, caro Pedro, que alguns adjetivos apresentem forma reduzida, que se usa exclusivamente para sua inclusão em adjetivos compostos. "Agrário", por exemplo, é substituído por "agro", como se vê em "técnicas agropecuárias" ou em "política agroindustrial". "Sucro", que vem do francês "sucre", também só se usa em compostos, como "sucroalcooleiro" e "sucroquímica".
Os adjetivos pátrios talvez sejam os maiores representantes desse tipo de ocorrência. "Francês" passa a "franco" ("filme franco-espanhol"); "austríaco" passa a "austro" ("Império Austro-Húngaro"); "italiano" passa a "ítalo" ("proposta ítalo-brasileira"); "chinês" passa a "sino" ("conflitos sino-soviéticos") etc.
Esses adjetivos pátrios compostos são grafados com hífen. Com os demais, é preciso cuidado, já que não se pode afirmar que haja padrão rigoroso. "O Vocabulário Ortográfico", editado em 1998 pela Academia Brasileira de Letras, registra "literocientífico", de que dá a variante "literário-científico". Registra também "literomusical", sem variante. O "Aurélio" só registra esse termo na última edição ("Novo Aurélio Século XXI") e dá esta definição: "1. Relativo à literatura e à música. 2. Que participa da natureza de uma e da outra".
Como se vê, caro Pedro, as homenagens literomusicais podem receber esse nome por duas razões: ou porque se dão na música e na literatura ou porque se dão em algo que funda as duas manifestações artísticas.
Outro leitor escreve para apontar erro meu nesta construção: "...que, por motivos óbvios, escreve-se...". Pouparei o leitor (não o que escreveu, mas o que lê esta coluna) das grosserias do missivista. Diz o mal-educado: "Se fosse..., o sr. Pasquale saberia que o pronome relativo "que" atrai o pronome átono (clítico)".
Traduzo: o cidadão quer dizer que errei ao colocar o "se" depois de "escreve"; deveria ter escrito "se escreve", para satisfazer a atração exercida pelo "que".
Fora menos grosseiro e mais estudioso, o missivista conheceria esta observação de Celso Cunha e Lindley Cintra: "Observe-se por fim que, sempre que houver pausa entre um elemento capaz de provocar a próclise e o verbo, pode ocorrer a ênclise". Segue-se um exemplo, de Ferreira de Castro.
No meu texto, a pausa é marcada pela vírgula, que encerra o isolamento da expressão adverbial "por motivos óbvios".
Que Deus o ilumine, senhor J. A. Carvalho. É isso.


Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail - inculta@uol.com.br



Texto Anterior: Remédios com venda livre trazem riscos
Próximo Texto: Há 50 anos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.