São Paulo, domingo, 01 de maio de 2011

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OPINIÃO

Fomos tolos, eles poderiam estar por aí rodando, mas só nos resta a saudade

RALPH GIESBRECHT
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há cerca de um mês, o bonde que estava encostado sobre os trilhos da rua Visconde de Parnaíba, à frente da antiga Hospedaria dos Imigrantes, foi colocado sobre um caminhão e levado dali para sempre.
Ele havia vindo de Santos, onde teve a mesma função até 1971, quando foi retirado de circulação.
Porém, ele nada tinha a ver com a cidade de São Paulo, que teve seus bondes elétricos como transporte urbano por 68 anos, de 1900 a 1968. Estes bondes da Light e depois da CMTC que circularam aqui, foram quase todos desmontados após seu fim.
Alguns poucos foram doados. Um deles está no Clube Pinheiros, outro em Bertioga, no SESC, e outro no museu do Transporte Coletivo na avenida Cruzeiro do Sul, todos parados e maltratados.
Finalmente e felizmente, alguém conseguiu devolvê-lo à cidade praiana.
Hoje, está sendo restaurado para rodar com poucos irmãos sobreviventes pelo centro da cidade.
Cidade plana, Santos sempre admirou os bondes, mais ainda do que São Paulo. Sua retirada em 1971 foi pressionada pelo lobby rodoviário.
Em São Paulo, a última linha, praça João Mendes-Santo Amaro (zona sul), havia terminado melancolicamente, no ano de 1968.
Eu, ainda criança e adolescente, andei nos bondes de São Paulo, que tinha os "camarões" (fechados) e os abertos, onde o cobrador andava pelos estribos com as notas de cruzeiros dobradas entre os dedos das mãos.
Os bondes foram uma tradição forçada a acabar depois de uma campanha de morte, onde se os culpavam por tudo de ruim no trânsito.
Injustiça e morte de algo que, ao contrário do que se apregoava então, nada tinha de obsoleto. Poderiam estar rodando até hoje, com adaptações e modernizações, como ocorre em inúmeras cidades europeias.
Como fomos tolos. No litoral, a cidade litorânea de Santos os colocou de volta.
Nós nem isso: somente ficamos com a saudade.

RALPH GIESBRECHT é pesquisador ferroviário e da história de São Paulo e edita o site estacoesferroviarias.com.br.


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