São Paulo, Sábado, 01 de Maio de 1999
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VIOLÊNCIA
Aluno de 18 anos de escola de Guarulhos foi morto com 13 tiros por um colega porque interferiu num jogo de cartas
Estudante é assassinado na sala de aula

MARTA AVANCINI
da Reportagem Local

O estudante Élcio Clêmio de Souza, 18, morreu na noite de anteontem, após ter sido atingido por 13 tiros dentro de uma sala de aula na Escola Estadual de 1º e 2º Graus Bartolomeu Carlos, no Jardim Leblon, em Guarulhos, Grande São Paulo. O autor dos disparos, segundo a polícia e testemunhas, foi um colega de classe, Wellington Ferreira Mendes, 22, foragido até o final da tarde de ontem.
A morte de Élcio se encaixa em uma sequência de casos de estudantes mortos ou feridos nas redondezas de escolas públicas ou dentro delas na região metropolitana de São Paulo, intensificada a partir de março (veja quadro).
A morte de Élcio foi presenciada por cerca de 35 estudantes e pelo professor Edinal Silva Santana. Wellington teria se irritado e disparado contra Élcio porque este interferiu em um jogo de cartas, que estava ocorrendo dentro da sala de aula por volta das 21h30. O diretor da escola, Aparecido Augusto Fernandes, disse que o crime foi motivado por uma dívida de jogo -Élcio estaria devendo R$ 10 para Wellington.
"Era o início da aula de português. O professor-substituto começou a fazer a chamada quando começou a confusão", conta a estudante Tatiana Santos Luz, 18, que presenciou o crime.
A testemunha relatou que Élcio disse para um colega chamado João, que estava jogando com Wellington, interromper a partida para não perder todo o dinheiro. Wellington não gostou da intervenção e disse para ele "não se meter", conta Tatiana. Élcio respondeu "Por que? Você vai me matar?", relata a jovem.
Depois disso, Wellington pegou a arma com outro colega que também estava na classe, Ariefferson Luiz Aguiar, 19, carregou-a e começou a disparar.
"Ele colocou as balas, apontou para a gente e começou a atirar."
Assustados, os alunos correram e se jogaram no chão. Wellington e Ariefferson fugiram do local.
Depois do crime, o diretor trancou a escola e impediu a entrada de pessoas que queriam socorrer o rapaz. "O menino ficou uns 20 minutos no chão. Ele só deixou a gente tirar ele de lá e levá-lo para o hospital depois que disse que me responsabilizava", conta Maria Alves dos Santos, 68, tia de Élcio, que mora em frente à escola.
Anderson Ramos Santos, 17, que acompanhou Élcio até o hospital, conta que o diretor alegou que tinha de esperar a polícia chegar para liberar o rapaz.
O garoto morreu ao chegar no hospital Alvorada e foi enterrado no final da tarde de ontem no cemitério Nossa Senhora do Bonsucesso, em Guarulhos.
O clima entre parentes e amigos de Élcio ontem era de revolta. "Ele era muito bem-humorado, alegre, brincava com todo mundo. Eu quero justiça", diz sua irmã mais velha, Elaine Cristina Souza, 19.
Segundo o advogado especializado em educação Mauro Bueno, a família pode acionar judicialmente o Estado, pois a Secretaria de Estado da Educação é responsável pela segurança dos estudantes dentro das escolas.
A secretária da Educação de São Paulo, Rose Neubauer, diz lamentar a morte do garoto e que a solução para a violência nas escolas depende da articulação de políticas entre a área da educação, saúde e segurança. "A escola é vítima de um problema maior que não pode resolver sozinha. É preciso que a sociedade se organize e que seja criada uma legislação mais rígida, que controle a venda de armas."
O pai do garoto, Nolasco de Souza, marmorista, 55, ainda pensa no que fazer. "É difícil aceitar. Era um bom menino. Tudo o que queria na vida era ficar famoso jogando futebol." Élcio integrava a equipe de juniores da Associação Atlética Flamengo, em Guarulhos.
"Ele fez um teste físico na quarta-feira (um dia antes de morrer) e ficou em primeiro lugar. Ele tinha muito futuro", diz Nerivaldo Rego, professor de futebol de Élcio.


Colaborou Roberto Ortega, do "Notícias Populares"

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