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Médicos "loteiam" eventos para indústria de remédios
Patrocinadores financiam até jantar para os presidentes dos congressos
Empresas bancam de
palestrantes a papel
timbrado; maior parte
dos médicos defende
patrocínio aos eventos
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
Papel timbrado, envelope,
capas de encosto de cadeira,
palestrantes e até o jantar do
presidente do congresso.
Tudo o que acontece nos
eventos médicos é hoje patrocinado pela indústria de
remédios e de equipamentos.
Os próprios organizadores
determinam os itens e os disponibilizam.
A maioria (58%) dos médicos paulistas ouvidos em
pesquisa do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do
Estado de SP), divulgada ontem pela Folha, concorda
que os congressos sejam financiados pela indústria.
Uma parcela (19%) vai ainda mais longe: é favorável a
que a indústria opine sobre a
programação de congressos
e simpósios médicos.
As sociedades médicas garantem que essa interferência não ocorre. Nem mesmo
quando os próprios palestrantes do evento são patrocinados pela indústria.
É o caso, por exemplo, do
próximo Congresso Brasileiro de Cardiologia, marcado
para setembro em Belo Horizonte e que deverá reunir
mais de 6.500 médicos.
No site do evento, a coordenação montou um "book
de comercialização", onde
estão discriminados os itens
a serem patrocinados-como
os que estão no início desta
reportagem- pela indústria.
PALESTRANTES
Viagens e hospedagem de
palestrantes nacionais e internacionais dos eventos figuram entre eles.
Segundo o cardiologista
Miguel Antonio Moretti,
coordenador de planejamento e infraestrutura da SBC
(Sociedade Brasileira de Cardiologia), é a entidade que
escolhe o palestrante, sem
nenhuma interferência do
patrocinador.
"A empresa custeia a passagem aérea, a hospedagem
e a alimentação do palestrante, mas é a SBC que decide
quem vai trazer. Ética e transparência são uma questão de
honra para nós."
Moretti afirma que o custo
do congresso médico é muito
alto e, sem o apoio da indústria, o valor teria que ser repassado aos médicos, o que
inviabilizaria a participação
da maioria deles.
"Não é todo médico que
pode se dar ao luxo de ficar
quatro, cinco dias sem ganhar nada e ainda tirar do
bolso R$ 3.000, R$ 4.000 para participar de um congresso. Sem a indústria, esse custo seria muito maior."
"JANTAR DO PRESIDENTE"
No item "jantar do presidente", a SBC informa ao potencial patrocinador que se
trata de uma recepção para
400 pessoas, oferecida pelo
presidente do congresso a todos os palestrantes internacionais e nacionais.
"Esse é um patrocínio importantíssimo, pois é uma
oportunidade de estreitar relacionamento com os principais formadores de opinião
do evento."
DISTORÇÃO
O médico José Luiz Gomes
do Amaral, presidente da
AMB (Associação Médica
Brasileira), diz que os 4.000
eventos científicos que ocorrem anualmente no Brasil
são essenciais não só para a
atualização médica como
para a troca de opiniões.
"A indústria pode divulgar, patrocinar os congressos
médicos. O que não pode é
distorcer a informação."
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