São Paulo, quinta-feira, 01 de julho de 2004

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FRAUDES NO LIXO

Papéis apreendidos pela Promotoria sugerem que funcionário estava em três subprefeituras na mesma hora

Boletim de fiscal indica nova irregularidade

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

A julgar pelos boletins de fiscalização apreendidos pelo Ministério Público, o dia 7 de maio de 2001 foi um verdadeiro inferno na vida de A.C., funcionário do Limpurb (Departamento de Limpeza Urbana). Os boletins sugerem que ele estava em até três subprefeituras da zona leste exatamente na mesma hora, atestando a execução de serviços de varrição ou a correta formação de equipes complementares de limpeza.
A aparente onipresença do fiscal é mais um dos indícios da existência de fraudes na fiscalização dos serviços de limpeza da cidade, alvo de investigação da polícia, da Ouvidoria e da Promotoria.
Os boletins em questão são base para o pagamento das empresas. Se a fiscalização falha ou deliberadamente se omite, o governo paga por serviços que não necessariamente foram realizados. Há indícios de que as irregularidades cheguem a consumir até 70% do valor de alguns desses contratos.
"Somados aos demais documentos, esses boletins formam uma prova absolutamente consistente", avalia o promotor Sérgio Turra, da Cidadania, um dos que conduzem as apurações.
Turra se refere à existência de boletins preenchidos antecipadamente -antes mesmo da data de execução dos serviços-, como a Folha noticiou ontem, e a documentos preenchidos com a mesma letra e assinados por vários fiscais do Limpurb.
Por trás de todos esses procedimentos estaria sempre a mesma irregularidade: de uso exclusivo dos funcionários públicos municipais, os boletins -de inspeção de serviços ou de controle de presença- estariam sendo irregularmente preenchidos pelas próprias empresas fiscalizadas e depois apenas assinados pelos representantes do governo.
Em todos os casos constatados até agora, eles evidentemente atestavam serviços realizados de forma plenamente satisfatória.
Já há indícios de envolvimento de 13 funcionários do Limpurb nas fraudes. Não se sabe, porém, o que eles recebiam em troca.
O Ministério Público deve pedir a suspensão dos contratos -que vencem em outubro deste ano.
A polícia pretende indiciar os envolvidos nos desvios por corrupção, falsificação de documento e formação de quadrilha.

Três em um
Os boletins preenchidos pelo fiscal A.C. foram apreendidos em 19 de maio, quando a Promotoria fez buscas simultâneas nas sedes do Limpurb e da empresa Cliba Ltda. Todos estavam no Limpurb e se referem a subprefeituras da área de atuação da Cliba.
Em 7 de maio de 2001, o dia de A.C. começou às 9h, na Subprefeitura de São Miguel Paulista, na qual ele atestou a presença de sete pessoas de uma equipe complementar de limpeza. Às 9h15 ele ainda estava lá, segundo um segundo boletim, mas também às 9h15 ele já atestava a varrição da avenida Aricanduva, na área da Subprefeitura de São Mateus.
Outro boletim de controle de presença indica que às 9h20 A.C. permanecia em São Mateus. Mas também às 9h20 ele já atesta a presença de equipes em São Miguel.
A sobreposição se repete às 9h25, às 9h30, às 9h35 e às 9h40. Às 11h, o fiscal surge em Itaquera. Às 11h05 já volta a São Miguel.
O vaivém se repete à tarde. Exatamente às 15h, por exemplo, A.C. atesta a varrição de ruas simultaneamente em Ermelino Matarazzo, em São Miguel Paulista e no Itaim Paulista. Mais curioso ainda: os boletins têm os números, respectivamente, 600, 603 e 612.
Ou seja: o fiscal, em tese, como se não bastasse estar em três lugares ao mesmo tempo, ainda esteve em outras áreas nessa mesma hora -ou inutilizou vários boletins.
Às 16h10, A.C. atesta a varrição de uma rua em Itaquera com o boletim 551 -numeração inferior, inclusive, aos documentos que ele supostamente preenchera na manhã daquele dia.


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