São Paulo, segunda-feira, 01 de agosto de 2005

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CIDADANIA

Trabalho cita a falta de projetos de geração de renda para internados em hospitais psiquiátricos voltarem para casa

Relatório mapeia programa de saúde mental

LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) feita no programa de saúde mental brasileiro lança luz sobre dificuldades no andamento da reforma psiquiátrica, mostrando que o processo de reinserção dos pacientes na sociedade ainda terá uma série de barreiras a ultrapassar.
Finalizado em maio e ainda inédito, o trabalho aponta um alto número de pacientes internados há mais de um ano em hospitais psiquiátricos -estima-se que sejam cerca de 20 mil. Por outro lado, cita a falta de projetos de geração de renda para esse público.
Ao analisar o programa De Volta para Casa, uma das prioridades do governo Luiz Inácio Lula da Silva nessa área, elogia a iniciativa, mas considera baixo o número de beneficiários em relação ao potencial, estimado em 11 mil pessoas. Usando dados do final de 2004, o relatório do TCU fala em 800 pacientes beneficiados pelo programa. Em junho, chegou-se a 1.263 atendidos.
O De Volta para Casa tem o objetivo de tirar dos hospitais pessoas internadas há mais de dois anos ininterruptamente.
Para isso, paga R$ 240 mensais ao paciente para que ele tenha condições de voltar a viver com a família. Mas o programa esbarra em dificuldades como a ausência de documentos dos pacientes, as internações interrompidas e os casos de pessoas que completaram o período exigido logo após a lei, de julho de 2003.

Outros problemas
Também há a falta de serviços residenciais terapêuticos, espécie de república para pacientes sem vínculo familiar. Pelos dados do governo, são apenas 294 no país, sendo 209 na região Sudeste. A meta é chegar a 526 neste ano.
"Como conseqüência de todos esses problemas, observa-se uma lentidão no processo de desospitalização dos pacientes crônicos, pois, além da rede substitutiva incipiente, há dificuldades de conseguir o benefício para os beneficiários potenciais, o que põe obstáculos ao seu processo de autonomia e o priva de um direito que lhe cabe", diz o texto da auditoria do Tribunal de Contas da União.
Aliado a isso, o trabalho aponta ainda um insuficiente número de centros de atendimento psicossocial, os CAPs. Os centros estão sendo montados nos municípios para atender a portadores de problemas mentais, usuários de drogas e de álcool. Devem ajudar a promover a reinserção social, em conjunto com os serviços residenciais terapêuticos.
Segundo o ministério, existem 622 CAPs, além de outros 250 em implantação. A região Sudeste concentra 45% dos que funcionam. O Amazonas, com uma população de 2,8 milhões de habitantes, ainda não tem nenhum.
Apesar de apontado pelo TCU como ainda insuficiente, o Rio Grande do Sul tem a melhor relação CAPs/habitante: 0,66 unidade para 100 mil moradores.
"As razões para isso devem-se ao fato de a implementação da reforma ser fortemente dependente da vontade política dos gestores locais. Embora o discurso da necessidade da reforma mostre ser quase unânime, na prática as ações tomadas nessa direção em alguns Estados não correspondem a essa orientação", diz o relatório dos auditores do tribunal.
Nas recomendações feitas pelo TCU ao governo federal estão a implementação de programas de avaliação dos CAPs, a serem implementados em conjunto com as secretarias da Saúde dos Estados.

Nova visão
Promulgada em 2001, a lei da reforma psiquiátrica prevê a internação de pacientes como último recurso a ser usado. A partir dessa diretriz, o governo federal vem desenvolvendo desde 2003 o programa de reestruturação hospitalar, induzindo os hospitais a reduzirem os leitos psiquiátricos por meio de aumentos diferenciados de repasse de recursos.
A reforma também prioriza a incorporação de ações de reinserção social às políticas públicas.
Aí é que entra o problema. Segundo a pesquisa do TCU, com base em questionários respondidos por 520 CAPs, 52,35% deles não desenvolvem nenhum tipo de atividade de geração de renda.
"A carência de oficinas para a geração de emprego e renda pode ser explicada pela falta de articulação com outras áreas da administração pública e por falta de uma política para incentivar a contratação de pessoas portadoras de transtornos mentais. A principal repercussão disso é a dificuldade para inserir os pacientes no mercado de trabalho, adiando ou dificultando sua integração social", diz o relatório.
Nesse quadro se encaixa ainda o preconceito, que acaba dificultando a implantação de atividades comunitárias. A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que 24% da população mundial apresente algum tipo de transtorno mental.


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