São Paulo, domingo, 02 de outubro de 2005

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DANUZA LEÃO

Adolescentes para sempre

Quando era garota, eu e as amigas e amigos da minha turma só queríamos uma coisa na vida: sermos independentes, para poder sair todas as noites, chegar tarde em casa e sermos donos de nossas vidas. Morar sós nem passava pela cabeça: era inimaginável sair da casa dos pais, a não ser casada; mas, lá no fundo, era o que começávamos a querer.
Mas trabalhar, ganhar nosso próprio dinheiro, já nos dava liberdade suficiente para levar a vida como queríamos, e o primeiro passo para chegar lá, isto é, podermos alugar um conjugado com uns colchonetes na sala, umas almofadas, e poder ouvir um som bem alto; esse era nosso sonho.
O tempo passou, as coisas mudaram. Os adolescentes de hoje podem tudo, e a tal ponto que ninguém quer sair da casa dos pais. E convenhamos: com toda razão. Se eles podem chegar em casa -ou não chegar-, botar um CD de funk aos berros, trazer as gatinhas ou os gatinhos para dormir, ter carro, mesada que dá para pagar a gasolina, o show de rock e a pizza, sem precisar assumir uma só das responsabilidades de um adulto, para que querer ser independente?
Outro dia um pai me contou a via-crúcis que foi quando o filho perdeu o celular -que todos têm, é claro. Ele passou o dia inteiro correndo de um lugar para o outro, até porque o menino não podia ficar sem o celular um dia que fosse. Isso aconteceu num sábado, e, à noite, esse pobre pai estava exausto, arrasado, tal o trabalho que deu. Detalhe: não era a primeira vez que o fato acontecia. Eu, ingenuamente, sugeri que deixasse que o próprio menino resolvesse esse tipo de problema sozinho, que, se ele tivesse que passar por isso sem nenhuma ajuda, dificilmente perderia o celular de novo.
O pai foi quase agressivo comigo; como não estar perto do seu filhinho -19 aninhos- numa hora dessas? Botei minha viola no saco e não disse mais nada.
Outro amigo se queixa do seu filho que, com 18 anos, ganhou um carro; em um ano, já bateu seis vezes - batidas ligeiras, mas batidas. O garoto garante que, quando sai para a balada e toma umas cervejas, dirige melhor do que nunca, e o pai não sabe o que fazer. Tive a audácia de sugerir que seria mais simples e mais seguro não deixar o garoto sair de carro à noite. O pai foi sincero, disse que não tinha coragem de fazer isso e que estava pensando em duas possibilidades: ou contratar um motorista para levar o menino às festas, que são várias e diárias, ou acertava com um rádio-taxi para fazer a ronda noturna com seu filho.
Tudo bem, tudo lindo, quem não quer ter pais assim? Só que esses meninos não vão crescer nunca. E crescer para quê? Para ter responsabilidades, contas para pagar, ter que providenciar alguém para vir consertar a televisão, o computador, ter comida na geladeira?
Eu conheço várias moças -e sobretudo rapazes- que já passaram dos 40, continuam na casa da mamãe, e, pelo andar da carruagem, não vão sair de lá nunca. Eles não têm profissão definida, fazem uns bicos às vezes, e, em qualquer emergência, os pais estão lá, para ajudar.
Cada um vive como quer, mas se um adolescente de 18 anos pode ser muito interessante, ser adolescente aos 50 é triste.
Ou deprimente.

E-mail - danuza.leao@uol.com.br


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