|
Próximo Texto | Índice
EDUCAÇÃO
Ex-menino de rua, promotor de Paripiranga (BA) ameaça processar pai que não matricula filho em escola
Promotor intimida pais e zera evasão
Fotos Leonardo Colosso/Folha Imagem
|
Crianças na janela de escola Franscisco de Paula Abreu
|
LUIZ FRANCISCO
da Agência Folha
em Paripiranga (BA)
A decisão de um promotor de processar todos os pais que têm filhos
entre 5 e 14 anos fora das salas de
aula está provocando uma verdadeira revolução educacional em
Paripiranga, cidade baiana na divisa com Sergipe.
Crianças e adolescentes que antes perambulavam pelas ruas de
Paripiranga (349 km de Salvador)
pedindo esmolas ou que trabalhavam na lavoura para ajudar no orçamento familiar trocaram as enxadas pelos livros e cadernos.
Desde que o promotor Gildásio
Rizério de Amorim, 43, ameaçou
colocar na cadeia os pais por
"abandono intelectual" (crime
previsto no artigo 246 do Código
Penal), o índice de matrículas no
ensino fundamental (1ª à 8ª série)
em Paripiranga cresceu 197% -de
1.803 (96) para 5.367 (98).
"Todas as crianças de Paripiranga em idade escolar estão matriculadas e frequentando as aulas
regularmente", disse a secretária
de Educação, Maria Sali, 32.
Amorim conta com uma "rede
de espiões" para notificar os pais
que não matriculam seus filhos.
"Além dos comissários de menores que visitam todas as casas do
município duas vezes por mês, eu
tenho a ajuda de mais cinco informantes", declarou.
Inicialmente, os pais que têm filhos fora da escola são intimados
para dar explicações ao promotor.
Policiais se encarregam de buscar
os que resistem à intimação.
"Os pais matriculam seus filhos
imediatamente quando explico
que podem ser presos", disse o
promotor. O crime de abandono
intelectual prevê prisão de 15 dias
a um mês ou pagamento de multa.
A obstinação do promotor pela
educação é reflexo de sua própria
infância. Até os 10 anos, Amorim
era analfabeto e vivia nas ruas de
Goiânia (GO). Recolhido pelo Juizado de Menores por comportamento inadequado, Amorim foi
matriculado em uma escola pública. "Logo percebi que se continuasse morando na rua eu iria me
transformar em um marginal."
Somente neste ano, o promotor
já notificou 197 pais que tinham filhos com até 14 anos fora da escola. "Fiquei com medo de ser preso
e resolvi matricular meus três filhos maiores", disse o agricultor
João Manoel dos Santos, 39.
Nos primeiros meses, a iniciativa do promotor trouxe problemas
para a Prefeitura de Paripiranga.
"Não tínhamos carteiras, mesas
e salas suficientes para abrigar todos os alunos", disse a secretária
Maria Sali. "A prefeitura ampliou
as escolas e o Estado repassou ao
município carteiras e mesas."
Funcionando em três turnos (à
noite, apenas para alfabetização de
adultos), as 52 escolas públicas de
Paripiranga mantêm, em média,
25 alunos em cada sala.
"Tenho certeza que, no futuro,
as crianças e adolescentes de Paripiranga não vão se arrepender por
ter estudado. Só lamento a omissão de quase todos os promotores
que não dedicam atenção especial
à educação", disse Amorim.
Próximo Texto | Índice
|