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TRÂNSITO
Em BH, Salvador, Rio e DF corte na iluminação pública favorece crescimento do número de acidentes fatais nas ruas
Morte por atropelamento dispara no apagão
Jorge Araujo/Folha Imagem
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Pedestre na rua da Consolação (região central) fora da faixa de segurança; segundo o IML, as mortes por atropelamento caíram em SP |
ALENCAR IZIDORO
IURI DANTAS
DA REPORTAGEM LOCAL
As mortes por atropelamento
dispararam em municípios que
reduziram a iluminação das ruas
no racionamento de energia elétrica, encerrado anteontem.
Levantamento da Folha em seis
capitais, cujos Estados estão entre
as maiores frotas de veículos do
país, indica que a violência no
trânsito aumentou a partir de junho de 2001 principalmente naquelas que mais desligaram as
lâmpadas dos postes -Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Salvador.
Some-se a elas o Distrito Federal.
Os dados mostram uma inversão na tendência de queda das
mortes desde a implantação do
Código de Trânsito Brasileiro, em
1998, exceto em municípios que
criaram alternativas para minimizar a falta de iluminação e na região Sul do país. Sem apagão, Curitiba e Porto Alegre mantiveram
a redução das vítimas de atropelamento em 2001 -de 24% e 19%,
respectivamente. Em São Paulo,
os números são controversos.
O caso mais evidente da relação
lâmpadas apagadas/aumento das
mortes por atropelamento é Salvador, cujo departamento de
trânsito forneceu à Folha dados
detalhados, incluindo até mesmo
os horários das ocorrências.
De janeiro a maio de 2001,
quando ainda não havia racionamento de energia, as mortes por
atropelamento caíram 29% em
relação ao mesmo período do ano
anterior -de 79 para 56.
De junho a dezembro, os registros subiram 37,5%. Detalhe: no
segundo semestre, na comparação ano 2000 com ano 2001, houve queda de 2,5% nos registros de
manhã e tarde -de 40 para 39-
e alta de 70,7% nos de noite e madrugada -de 41 para 70. A capital
da Bahia teve 19% das lâmpadas
dos postes desligadas.
"É uma questão lógica de ver e
ser visto. A maioria dos motoristas só tende a enxergar os pedestres se houver iluminação na rua",
explica Cristina Aragón, gerente
de educação do trânsito da Superintendência de Engenharia de
Tráfego (SET) de Salvador.
Philip Anthony Gold, consultor
de trânsito do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento),
evita comentar os resultados das
capitais brasileiras que não apresentaram os horários das mortes.
"Há um risco muito grande de
estarem subestimados, além da
dificuldade de identificar os outros fatores. Quando diminui a
iluminação pública, não é opinião
minha, é certeza, comprovada no
mundo inteiro, que os atropelamentos aumentam", afirma Gold,
temendo que os dados escondam
uma situação ainda mais alarmante sobre a falta de iluminação
especificamente à noite.
O especialista David Duarte Lima, professor da Universidade de
Brasília, diz que faltou "racionalidade" no apagão. "É possível economizar energia de maneira racional, mas tudo foi feito de forma
atabalhoada. O desligamento poderia ter sido seletivo, não deveria
atingir as ruas problemáticas em
segurança de trânsito."
Tendência
Os números do Distrito Federal,
que teve 20% de redução da iluminação pública, indicam uma
tendência semelhante à verificada
em Salvador. De janeiro a maio, as
mortes por atropelamento caíram
1,5%. De junho a dezembro, houve aumento de 18% -sempre na
comparação com os respectivos
períodos do ano anterior.
No Rio de Janeiro, as estatísticas
mostram que as mortes por atropelamento já apresentavam uma
pequena elevação -de 12%-
nos cinco primeiros meses de
2001. O quadro, porém, se agravou a partir de junho -quando
as ocorrências subiram 41% em
relação aos mesmos meses de
2000. A capital fluminense teve
29% das lâmpadas desligadas.
O mesmo quadro se repetiu em
Belo Horizonte -onde os casos
aumentaram em torno de 12% até
maio e passaram a subir 19% no
período do racionamento de
energia. A queda de iluminação
pública no município foi de 30%.
Na capital paulista, os dados do
IML (Instituto Médico Legal)
apontam queda de 11% das mortes por atropelamento no período
do apagão -fato que a CET
(Companhia de Engenharia de
Tráfego) atribui a um projeto de
iluminação das faixas de pedestre.
A Polícia Militar, porém, tem
um levantamento diferente, baseado nos registros do CPTran
(Comando de Policiamento de
Trânsito), que só acompanha as
ocorrências até que as vítimas sejam levadas ao pronto-socorro.
Essas estatísticas mostram uma
alta de 87% das mortes.
Os dados disponíveis comprovam aquilo que os especialistas
previam, já que mais de metade
dos atropelamentos ocorrem à
noite. Mas as medidas atenuantes,
em geral, não foram tomadas.
O racionamento foi instituído
pelo governo federal no dia 21 de
maio de 2001. A partir dessa data,
as prefeituras receberam um prazo até 30 de junho para reduzir
em 35% a carga de energia da iluminação pública. Os municípios
começaram a religar as lâmpadas
no final de janeiro deste ano, mas,
em São Paulo, por exemplo, as luzes dos postes só voltarão ao normal no final deste mês.
No livro "Segurança de Trânsito: Aplicações de Engenharia para
Reduzir Acidentes", publicado no
Brasil em 1998, Philip Gold cita
dados da Inglaterra que mostram
uma queda de 43% nos acidentes
noturnos com pedestres em locais
cuja iluminação foi melhorada.
Segundo ele, uma adaptação brasileira de pesquisas internacionais
indica um custo de US$ 141 mil
para cada morte no trânsito.
Estudo da própria CET de São
Paulo em 103 faixas de pedestre,
realizado na gestão anterior, mostrou uma redução de 50% na
quantidade de atropelamentos
após a instalação de luminárias.
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