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PANTANAL PAULISTANO
Área do J. Pantanal, na várzea do Tietê, na zona leste, foi afetada pelo transbordamento do rio
Favela continua alagada 5 dias após chuva
JOÃO WAINER
REPÓRTER-FOTOGRÁFICO
ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA
Água até o joelho, mau cheiro,
lama e "ilhas" de lixo e entulho
por toda parte. Esse é o cenário de
pelo menos 50 casas, onde vivem
cerca de 300 pessoas, no Jardim
Pantanal, na zona leste de São
Paulo, por causa do transbordamento do rio Tietê.
A água começou a subir com as
chuvas da noite de quarta-feira
passada. Chegou a 1 m e até o começo da noite de ontem ainda
atingia cerca de 60 cm.
"Tivemos que correr para a casa
da minha cunhada, numa área
mais alta, porque a nossa ficou tomada pela água", conta a doméstica Maria Goreti Bispo Nascimento, 36, mostrando sua casa,
de um cômodo de 4 m2, onde mora com seis filhos e o marido.
Os poucos móveis da moradora
estavam apoiados sobre blocos de
cimento. "Não temos como escoar a água porque tudo aqui está
alagado. Ela não tem para onde ir.
Nem nós", diz Maria Goreti. "O
colchão das crianças ficou encharcado. Minha esperança é que
a geladeira não estrague. Mas só
posso verificar quando a água baixar, se ela baixar", disse.
É a terceira enchente que o bairro, conhecido como "cotovelo"
do Tietê, enfrenta neste ano. As
duas primeiras ocorreram entre
janeiro e fevereiro, mas, segundo
os moradores, a da última quarta
foi a pior. Eles temem reviver a
enchente de janeiro de 1997,
quando algumas casas chegaram
a ficar alagadas durante 18 dias.
O Jardim Pantanal é um bairro
formado por invasões na várzea
do rio Tietê. A área inunda durante o período de chuvas intensas.
Para Ronaldo Delfino de Sousa,
42, líder comunitário, a culpa da
inundação não pode ser atribuída
exclusivamente às chuvas, mas
sim ao fechamento da barragem
da Penha, no parque ecológico
Tietê. "A barragem deixou o rio
sem enchentes nas regiões onde
transitam a elite, mas essa não é a
realidade do Jardim Pantanal."
Segundo ele, depois do desaçoriamento de um trecho do rio feito em 99 e da abertura da barragem da Penha, as enchentes diminuíram na região. "O bairro ficou
livre de enchentes durante dez
anos. Elas voltaram a ocorre neste
ano", disse Delfino.
O DAEE (Departamento de
Águas e Energia Elétrica do Estado) nega relação entre as enchentes no bairro e a barragem da Penha (leia texto abaixo).
O terreno do Jardim Pantanal
começou a ser ocupado há cerca
de 20 anos. Um decreto previa a
remoção de 5.000 famílias no final
dos anos 90 para a construção de
um parque. Segundo Delfino,
apenas algumas delas deixaram a
área e o parque não saiu do papel.
O DAEE informa que nos últimos anos o governo do Estado removeu cerca de mil famílias, mas
outras 500 teriam ocupado a área.
Para o líder comunitário, falta
um projeto do governo do Estado
tanto de ordem habitacional como ambiental para resolver o problema de enchentes no bairro.
No "cotovelo" do Tietê existem
cerca de 2.000 casas, quase todas
ocupações feitas por migrantes, a
maioria nordestina. Ontem, os
moradores circulavam em contato direto com a água empoçada,
inclusive muitas crianças.
"Na minha família tivemos três
casos de hepatite, sem falar no número de leptospirose na vizinhança. Meu filho não vai à escola
desde quinta. Tenho medo que ele
se contamine", diz a dona-de-casa Liliam Oliveira da Silva, 27.
Com o bebê Elias de apenas dois
meses nos braços, a doméstica Janilde Jesus Santos, 27, não pensa
em deixar sua casa, que sofreu
alagamento nas três enchentes este ano. Seu marido, Ivanildo Ferreira dos Santos, 27, diz a água estragou o guarda-roupa do casal e
que a geladeira não funciona. Até
as 18h de ontem, os dois cômodos, de 20 m2, da família permaneciam submersos em cerca de 80
cm.
Os moradores se recusam a ir
para um abrigo, proposta oferecida pela prefeitura. "Quem vai cuidar do pouco que restou?", questionava o cozinheiro José João da
Silva Filho, 45. "Quando a água
baixar, vamos voltar para as nossas casas? E quando encher novamente, o que faremos?"
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