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AIDS
Gestão petista retoma estratégia polêmica do governo anterior para forçar diminuição dos preços de três medicamentos
Ministério ameaça quebrar patentes
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
O Ministério da Saúde volta a
ameaçar três gigantes da indústria
farmacêutica com a quebra de patentes para obter uma redução
nos preços de drogas contra a
Aids. As empresas serão chamadas a negociar neste mês.
Para exigir preços menores de
três drogas, a pasta está na reta final de um novo estudo que mostra que o país, dono do maior programa de tratamento dos países
em desenvolvimento, tem condições técnicas para iniciar a fabricação de produtos mais baratos
em laboratórios públicos.
As drogas efavirenz (do laboratório farmacêutico Merck Sharp
& Dohme), nelfinavir (Roche) e
lopinavir (Abbott) poderão consumir neste ano mais de R$ 300
milhões, ou 60% de tudo que o
governo pretende gastar no programa de medicamentos contra o
vírus da Aids -R$ 516 milhões.
A situação é preocupante, uma
vez que a pasta avalia que o orçamento previsto necessitará de suplementação de pelo menos R$ 57
milhões para a manutenção do
fornecimento gratuito de drogas
às 128 mil pessoas que devem precisar de tratamento neste ano.
Mesmo sem a conclusão do estudo, a Coordenação de Doenças
Sexualmente Transmissíveis/
Aids do ministério informa que o
trabalho mostra que a economia
seria "significativa" se fosse iniciada a produção nacional. O trabalho, segundo o ministério, deve
ficar pronto nos próximos dias.
Uma diminuição de 10% nos
gastos seria suficiente para, por
exemplo, bancar por um ano
3.000 projetos de ONGs que recebem verba pública para auxiliar
portadores do vírus da Aids.
"Nossa posição é utilizar todos
os instrumentos disponíveis, caso
não consigamos uma redução dos
preços", afirma Alexandre Grangeiro, coordenador-adjunto do
Programa Nacional de DSTs/
Aids. Segundo ele, a preferência é
pela negociação. "Mas a quebra
de patente é prerrogativa nossa e
temos base legal para isso", afirma. "Diante do cenário econômico, ou baixamos os preços ou iniciamos a produção nacional."
Com a decisão, o Ministério da
Saúde da era petista retoma estratégia da gestão do ex-ministro José Serra (PSDB) que teve repercussão internacional.
O licenciamento compulsório
está previsto na Lei de Patentes
brasileira, de 1996, em casos em
que houver abuso econômico ou
venda por um período longo com
ausência de produção local.
A partir de 2000, o ex-ministro
Serra fez ameaças sucessivas aos
laboratórios que produzem remédios para o coquetel anti-HIV,
obteve descontos e a quebra de
patentes não se concretizou.
ONGs do mundo inteiro apoiaram a ação, assim como os governos de outros países.
Os EUA chegaram a levar a
questão ao fórum máximo de arbitragem, a OMC (Organização
Mundial do Comércio), que entendeu que a legislação brasileira
não fere o Trips, acordo internacional sobre direitos de propriedade intelectual. O Trips prevê o
licenciamento compulsório para
os casos de emergência nacional.
A indústria farmacêutica teme
uma redução de preços no Brasil
justamente por causa do risco de
um "efeito dominó", de que a decisão abra precedente e afete os
lucros do setor em escala global. O
programa de combate à Aids brasileiro é considerado modelo pelos organismos internacionais e
assumiu a liderança em processos
de negociação.
ONGs ligadas à área defendem
que o governo cumpra a ameaça.
"Quebrar definitivamente as
patentes é a única forma de seguir
com essa política, pois não dispomos de dinheiro e o número de
doentes de Aids aumenta a cada
dia no Brasil", diz Mário Scheffer,
diretor do Pela Vidda/São Paulo.
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