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São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2003

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DANUZA LEÃO

Mãe, esse problema

Mães: a sua é exatamente como você gostaria que ela fosse? Duvido: nenhuma é.
Não existem mães perfeitas, até porque a perfeição não é igual para todos os filhos.
Alguns têm como sonho supremo ter uma que cozinhe, lave, passe, costure, seja carinhosa, dê colo e, sobretudo, que saiba ouvir (sem dar palpite). Mas aí o destino faz com que sua mãe seja Sophia Loren, e temos aí mais uma criança frustrada. Que ela seja a mulher mais linda que pode existir, uma atriz magnífica e admirada pelo mundo inteiro, de nada vai adiantar (e se ela for uma simples dona-de-casa que vive na igreja rezando e se dedica a obras de caridade, o filho vai ser tão frustrado quanto).
A verdade verdadeira é que não existe mãe perfeita -não para os filhos: eles sempre querem que elas sejam diferentes do que são e, frequentemente, o contrário do que são. Se tem cabelos brancos, usa um coque, é caseira, está sempre pronta para cuidar dos netos, conta histórias do passado, é resignada e deixa sempre no ar a idéia do quanto é infeliz e solitária, é um problema.
Como eles gostariam de que ela fosse mais alegre, tivesse se casado de novo (para largar um pouco do pé), que estivesse mais por dentro dos acontecimentos do mundo, usasse roupas coloridas e às vezes incomodasse bastante pedindo coisas. Mas não, ela só fala de tristezas e doenças, e, assim, é claro que não dá.
Existem também as outras, que sempre trabalharam, se mantêm razoavelmente em forma, viajam em grupo, gostam de uma bebidinha aos sábados e suspiram por Antônio Fagundes. Se não dá para levar as primeiras a um restaurante, as segundas, então, nem pensar. Elas são capazes de fazer charme para quem não devem -e mãe perto de filho não pode se fazer de interessante- e de contar histórias do passado, aquelas bem inconvenientes, coisa que nenhum filho suporta. Para eles, mãe não pode ter tido um só homem na vida além do seu próprio pai -e, se teve, que fique calada para sempre.
Não tem jeito: mãe e filho não podem conviver socialmente, só em casamentos e batizados, desde que ela não toque em álcool. Em alguns raros momentos de lucidez, eles até se conformam, lembrando que mãe não se escolhe (mas nunca pensam que filho também não).
Já as mães acham os filhos perfeitos. Para elas, eles são os mais lindos, os mais inteligentes, os mais talentosos, os mais sedutores e, se alguma coisa na vida deles não deu certo, a culpa é sempre dos outros. Se o casamento foi para o brejo, é porque a mulher não entendeu o tesouro que tinha nas mãos; se foi demitido, é porque alguém da empresa em que trabalhava tinha inveja de suas qualidades, e por aí vai.
Se o filho se meteu em alguma confusão, foi por culpa das más companhias, se não conseguiu se acertar na vida, é porque não teve sorte, se tudo que faz dá errado, é porque o mundo é injusto. Elas acham que seus filhos são a oitava maravilha do mundo e repetem isso a cada instante, enquanto fazem o pratinho de que eles mais gostam e arrumam a bagunça do quarto.
Aí, quando eles resolvem se tornar adultos -o que acontece cada vez mais tarde- e encontram uma mulher que fala com eles de igual para igual, aponta seus erros e reclama de alguma coisa, eles se sentem incompreendidos e infelizes. Culpa de quem? Da mãe, é claro.
Como sempre, aliás.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br


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