São Paulo, terça-feira, 03 de agosto de 2004

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GUERRA SEM TRINCHEIRA

Crimes ocorrem principalmente no horário de folga; profissão é mais arriscada no Brasil que na Colômbia

País tem um policial morto a cada 17 horas

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

A cada 17 horas um policial civil ou militar é assassinado no Brasil, estando em folga ou em serviço.
Entre janeiro e a primeira quinzena de julho, pelo menos 281 policiais civis e militares foram mortos, segundo levantamento feito pela Folha em 26 Estados e no Distrito Federal com dados das secretarias estaduais de Segurança e de corporações policiais. Os números de São Paulo e Minas Gerais foram repassados por sindicatos e associações de policiais.
Comparado a outros países, o número é alto. Nos EUA, 34 policiais foram mortos no período. Na Colômbia, que enfrenta uma guerrilha desde a década de 40, foram 65. Na Grã-Bretanha, apenas um policial foi morto neste ano.
Mais da metade dos policiais (197, 71%) assassinados no Brasil não estava em serviço. A Polícia Militar apresenta o maior número de baixas, 225 -176 em folga. A Polícia Civil teve 56 assassinados, 35 no horário de trabalho. Um policial é morto em folga nas mais diversas situações. É freqüente a morte no bico de segurança.
Pelo levantamento, o Rio é o Estado onde ocorreu o maior número de mortes, 81 (69 PMs e 12 civis). São Paulo vem em 2º, com 59 mortes- 51 na PM e oito na Civil.
Na Bahia, que ficou em 3º, a maioria dos policiais mortos fora do serviço reagiu a roubos em ônibus, como o PM Armando Lima, que, em 7 de fevereiro, tentou tomar a arma do ladrão.
Outro risco é o policial ter a função descoberta por criminosos. Foi o caso do inspetor Marcel Leal Layson, da Polícia Civil. Em 21 de fevereiro, ele foi parado em falsa blitz na rodovia Rio-Santos, em Mangaratiba (70 km do Rio). Ao verem a carteira policial, os criminosos o mataram.
Muitos morrem por vingança. Entre janeiro e fevereiro, os policiais civis mineiros Sidrack Correia da Rocha, Anderson Eustáquio Fernandes, Marcos Antônio Paixão e Delson Rocha da Piedade foram alvo de criminosos que haviam prendido.
No Rio, boa parte das mortes de policiais em serviço não ocorre em confronto com criminosos, mas em ataques de traficantes. Há duas semanas, os PMs Sadi Silva Damásio e Luís Alberto Ramos dos Santos Júnior foram metralhados durante patrulha na avenida Radial Oeste (zona norte).
No último dia 9, os policiais Alex Bezerra Chaves e Carlos Alberto da Silva foram mortos por traficantes quando estavam parados em frente ao Norte Shopping.

Olho por olho
"Morre mais policial no Brasil porque as autoridades combatem a violência com violência. Com isso, há muitas mortes em ambos os lados. Mesmo que 70% tenham sido de folga, os outros 30% representam um índice muito alto", diz a socióloga Julita Lemgruber.
Para o sociólogo Eduardo Cerqueira, da Fundação João Pinheiro, vinculada ao governo mineiro, morrem mais policiais aqui que nos EUA porque os americanos respeitam mais as autoridades.
"Nos EUA, uma pessoa pensa duas vezes antes de atacar um policial, sua pena pode ser multiplicada. No Brasil, se o indivíduo atacar um policial, só é preso imediatamente se for flagrante."
O pesquisador Gláucio Soares, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro), disse não ser surpresa o Brasil ter mais policiais mortos que os EUA. "O índice de homicídios aqui é três vezes maior que lá. Com isso, os policiais brasileiros têm três vezes mais chances de serem mortos."
O dado de policiais assassinados nos EUA foi obtido no site Office Down Memorial Page (www.odmp.org), que reúne dados da polícia norte-americana, do Canadá e de países europeus.
Na Colômbia, os números são da Agência Nacional de Notícias Policiais. Na Grã-Bretanha, as informações saíram do site www.policememorial.org.uk.


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