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JUSTIÇA
Para desembargador, penas alternativas não são adotadas porque o Estado não fiscaliza os menores em liberdade provisória
Ação na Febem é relevante, diz juiz do TJ
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O desembargador Caetano Lagrasta Neto, 61, do Tribunal de
Justiça de São Paulo, entende que
as medidas propostas pelo governo do Estado para a crise da Febem -como a volta dos menores
às cidades de origem e a fixação
de prazos de internação- são relevantes. Mas diz que "estamos
num beco sem saída". Os juízes
não adotam penas alternativas
porque o Estado não fiscaliza os
menores em liberdade provisória.
Lagrasta foi juiz criminal de menores em Guarulhos, de 1977 a
1981. Ele critica o fato de o Estado
de São Paulo não ter defensoria
pública. E prega "o sistema rígido
de controle de liberdade assistida". Secretário-executivo do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais, diz que o Judiciário
estadual perdeu o poder de pressão sobre o Executivo estadual
desde que os governadores passaram a ser julgados pelo Superior
Tribunal de Justiça.
Folha - Qual a medida mais importante no pacote anunciado pelo
Estado para a crise da Febem?
Caetano Lagrasta Neto - O menor poder voltar para perto da família. Desde que os juízes, as autoridades e a comunidade no interior tenham meios de recebê-lo,
de dar instrução e dar profissão.
Folha - E quanto à fixação de prazos de internação na Febem?
Lagrasta - Também é relevante.
Ninguém pode ficar detido por
tempo indeterminado. Sabendo
que há uma perspectiva de sair, o
menor se prepara. Seria o começo. É melhor do que dar dinheiro
para a família. O ECA [Estatuto da
Criança e do Adolescente] tem
um artigo prevendo que o menor
pode ser trancafiado, mas não estabelece por quanto tempo. Então, às vezes, ele é esquecido lá.
Folha - Por que ele é esquecido?
Lagrasta - Porque um Estado como São Paulo não tem defensoria
pública. E o Estado acha preferível
pagar assistência judiciária a ter
uma defensoria pública, um princípio constitucional. Ninguém se
rebela contra isso...
Folha - Como funciona hoje?
Lagrasta - Você tem o procurador do Estado, que é um bom advogado, defendendo milhares de
pessoas. Numa comarca pequena,
o juiz indica o advogado, que recebe um subsídio. Há um convênio entre a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] e a Procuradoria Geral do Estado. O Estado paga o convênio com dinheiro que
deveria ser recolhido à Justiça.
Folha - E quanto à construção de
novas unidades?
Lagrasta - É para instrução profissional? Se for para fazer novos
depósitos de presos, sou contra.
Folha - A carência de recursos
compromete o trabalho da Justiça
no acompanhamento do menor?
Lagrasta - Isso é uma responsabilidade do Estado, não é nossa. O
menor tem que ter direito a um
defensor público e tem que ter direito a um exame psiquiátrico.
Uma infra-estrutura que permitisse ao juiz condenar, mas com
absoluta confiança, sabendo se ele
realmente tem desvio de comportamento, se tem debilidade mental. Como vão cuidar do menor
não é um problema do Judiciário.
Folha - Qual a importância de a
Febem ser dirigida atualmente por
um secretário de Justiça?
Lagrasta - Finalmente, o secretário da Justiça [Alexandre de Moraes], agora na presidência da Febem, percebeu que "a culpa" não
é toda do Judiciário. O drama hoje
é "descentralizar". Centralizou
porque o juiz no interior tem menos condições do que na capital.
Folha - Como era na sua época?
Lagrasta - Quando eu era juiz de
menores, havia um verdadeiro estelionato verbal. O juiz conversava com a família, dava um jeitinho
para o menor ficar quietinho.
Uma semana, 15 dias depois, voltavam todos para o Fórum.
Folha - O sr. escreveu, há dez
anos, que o juiz termina conivente
com o delito da criança ou abarrota
os reformatórios. O que mudou?
Lagrasta - Eu tenho a impressão
que piorou. Você começou a juntar menores com quase maiores.
O menor é responsável na medida
da sua responsabilidade. Mas isso
deve ser apurado de forma multidisciplinar, com psicólogos, psiquiatras. Não é um juiz entrevistando o sujeito em cinco minutos.
Folha - O sr. já disse que seria desnecessário encarcerar o ladrãozinho que roubou o relógio, colocando-o em regime fechado. Como evitar a primeira internação?
Lagrasta - Se o Estado der condições para o juiz aplicar penas alternativas, tudo bem. Os juízes
têm uma certa resistência. Não
aplicam porque não há uma fiscalização. De que adianta colocar o
menor num regime alternativo, se
o Estado não fiscaliza? Ninguém
se preocupa em ver como estão os
pais. Qual é a condição que eles
têm para os filhos?
Folha - O sr. defendeu o júri popular para menores imputáveis. O juiz
dosaria a pena. Isso não tornaria o
processo mais demorado?
Lagrasta - Tudo que a gente faz,
a gente imagina um país funcionando. "Ah, mas o júri não funciona." E a Febem está funcionando? Estamos num beco sem saída.
Fez-se uma reforma e não mexeram no júri. As decisões do júri
são independentes. Só que não se
pode jogar na mão do jurado, que
é um leigo, a distribuição da pena,
o que é difícil até para nós.
Folha - Como a comunidade deveria participar?
Lagrasta - Quem emprega o
egresso da Febem? Não estou falando do egresso da cadeia. As
empresas preferem pagar multa.
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