UOL


São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DANUZA LEÃO

Aposentadoria: o perigo

É claro que todos nós, várias vezes durante a vida, sonhamos com o glorioso dia de parar de trabalhar -a famosa aposentadoria de que tanto se fala; tem gente que já escolhe o primeiro emprego pensando nisso, e todo mundo sabe que as mulheres que começam a trabalhar com 18 podem se aposentar aos 48. Muito justo, depois de 30 anos ralando. Mas, se fosse eu, pensaria muito antes de tomar a decisão.
Houve um tempo em que as mulheres de 30, as balzaquianas, eram consideradas quase velhas. Ridículo, não? Hoje, homens e mulheres por volta dos 50 estão em plena forma física e mental, e a contribuição que podem dar ao trabalho que fazem, com a experiência que acumularam, é inestimável.
Quem se aposenta aos 50 vai fazer o que da vida? Cuidar dos filhos? Não, esses já cresceram. Dos netos? É o caminho mais curto para virar uma anciã. Jogar biriba com as amigas, ver novela? Logo, logo, vai entrar em depressão -a famosa síndrome da aposentadoria. É melhor colar selo o dia inteiro, implicando com a colega que passa o dia no telefone, ansiando pelo fim de semana e pelas férias, do que ficar em casa lembrando o passado ou pensando em doenças, na velhice e na morte. Quem trabalha permanece saudável, pois está atuando e participando do mundo -seja em que atividade for.
Quantos anos tem Lula, que começou a trabalhar ainda menino? Cinquenta e sete. Quantos anos tinha Fernando Henrique quando deixou a Presidência? Setenta, acho. Maria da Conceição Tavares, botando fogo pelas ventas? Setenta e dois. Bibi Ferreira? Oitenta. Fernanda Montenegro? Muitos. Oscar Niemeyer? Noventa e quatro. Todos ti-nin-do.
Aposentar-se é um perigo: quem não tem um amigo aposentado triste e infeliz? E o oposto: quem tem um amigo aposentado alegre e feliz, depois de seis meses sem fazer nada? Se nem os ricos escapam -eles que podem passar a vida fazendo cruzeiros pelo mundo-, imagine os pobres. Estão melhor os que, com 70 ou 80, por necessidade ou sabedoria, têm a felicidade de estar cuidando de suas coisas, isto é, trabalhando: o dia é longo quando não se faz nada, e passar o resto da vida num feriado eterno é de pirar.
Quem trabalha está inserido no mundo; tem seus aborrecimentos mas escapa daquela tristeza letal de não saber como ocupar o tempo, daqueles momentos de vazio tão frequentes aos que não têm uma atividade. E já que o PT gosta tanto de uma novidade, poderia inventar mais uma: a pré-aposentadoria.
A partir de uma determinada idade, a pessoa teria diminuída a sua carga horária: quem trabalha oito horas por dia passaria a trabalhar quatro, e parte desse tempo seria dedicado a formar os que estivessem começando na profissão. Por um lado, seria uma fase de adaptação à nova etapa da vida; por outro, estaria ajudando a formar os novos profissionais, cargo que não costuma existir nas empresas. Quem não se lembra do primeiro dia num trabalho novo, quando não se sabe nem onde é o banheiro e a lanchonete, quanto mais trabalhar?
Faltou à campanha que está querendo esclarecer a população sobre os problemas da Previdência dizer -e mostrar, com exemplos e depoimentos- que, tendo saúde, trabalhar ainda é a melhor maneira de viver.

E-mail - danuza.leao@uol.com.br


Texto Anterior: Caso de favela é Barão de Mauá paulistano
Próximo Texto: Há 50 anos
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.