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São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

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"Perdi o caráter, a droga fala mais"

DA REPORTAGEM LOCAL

A maior parte das usuárias de crack entrevistadas pelo Cebrid afirma não se lembrar da primeira vez em que se prostituíram para ter a droga. "Dizem que quem usa droga não tem mais cérebro. Eu acredito. Não me lembro com quem foi nem onde. No começo eu deitava na cama, o homem deitava em cima de mim, aquilo eu... a aflição de querer fumar [crack", eu não via a hora que acabasse nem olhava pra cara do sujeito", diz D., 27, uma das entrevistadas.
A vergonha, segundo a pesquisa, acaba superada depois pelo consumo do crack. "A primeira vez foi ruim, mas depois já era. Perdi o caráter, a vergonha. A droga fala mais alto", diz R., 35.
Nas ruas, durante a fissura, elas afirmam não ter como escolher os clientes. "A exigência única em relação ao parceiro é que tenha dinheiro ou pedra para pagar pelo "serviço"", afirma a pesquisadora Solange Nappo, no estudo.
A maioria delas tinha menos de 20 anos quando começaram a usar crack, influenciadas, em geral, por amigos, namorados ou companheiros. Com o tempo, deixaram trabalho, família, maridos e filhos para se dedicar à prostituição que as alimenta de crack.
Segundo a pesquisa, 69% das entrevistadas começou a ter relações sexuais com menos de 14 anos e 72% delas disseram não saber que tinham de se proteger nessa primeira relação.
Nas ruas, estão sujeitas a todas as modalidades de sexo. Todas são preocupantes, afirma Nappo, por causa da falta do uso de preservativos. Em especial, a pesquisadora chama a atenção para o sexo oral, porque o dependente de crack, ao fumar a pedra em cachimbos improvisados, acaba queimando e ferindo os lábios.
A pesquisa do Cebrid levou quase um ano para recrutar e entrevistar as 80 mulheres que serviram como base para o primeiro estudo no país sobre o tema.
Para descobrir onde as crackeiras esperavam seus clientes, as pesquisadoras seguiram pistas deixadas por usuários atendidos pelo Cebrid. O passo seguinte foi convencê-las a dar entrevistas. "São mulheres sem horários para se prostituir. Elas se prostituem na hora da "fissura'", diz Nappo.
As entrevistadas não foram submetidas a exame de HIV. Mas quatro disseram que eram portadoras do vírus. Para a pesquisadora, a maior dificuldade em atraí-las foi a "paranóia" que apresentam os usuários do crack.


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