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"Perdi o caráter, a droga fala mais"
DA REPORTAGEM LOCAL
A maior parte das usuárias de
crack entrevistadas pelo Cebrid
afirma não se lembrar da primeira vez em que se prostituíram para ter a droga. "Dizem que quem
usa droga não tem mais cérebro.
Eu acredito. Não me lembro com
quem foi nem onde. No começo
eu deitava na cama, o homem deitava em cima de mim, aquilo eu...
a aflição de querer fumar [crack",
eu não via a hora que acabasse
nem olhava pra cara do sujeito",
diz D., 27, uma das entrevistadas.
A vergonha, segundo a pesquisa, acaba superada depois pelo
consumo do crack. "A primeira
vez foi ruim, mas depois já era.
Perdi o caráter, a vergonha. A
droga fala mais alto", diz R., 35.
Nas ruas, durante a fissura, elas
afirmam não ter como escolher os
clientes. "A exigência única em
relação ao parceiro é que tenha dinheiro ou pedra para pagar pelo
"serviço"", afirma a pesquisadora
Solange Nappo, no estudo.
A maioria delas tinha menos de
20 anos quando começaram a
usar crack, influenciadas, em geral, por amigos, namorados ou
companheiros. Com o tempo,
deixaram trabalho, família, maridos e filhos para se dedicar à prostituição que as alimenta de crack.
Segundo a pesquisa, 69% das
entrevistadas começou a ter relações sexuais com menos de 14
anos e 72% delas disseram não saber que tinham de se proteger
nessa primeira relação.
Nas ruas, estão sujeitas a todas
as modalidades de sexo. Todas
são preocupantes, afirma Nappo,
por causa da falta do uso de preservativos. Em especial, a pesquisadora chama a atenção para o sexo oral, porque o dependente de
crack, ao fumar a pedra em cachimbos improvisados, acaba
queimando e ferindo os lábios.
A pesquisa do Cebrid levou
quase um ano para recrutar e entrevistar as 80 mulheres que serviram como base para o primeiro
estudo no país sobre o tema.
Para descobrir onde as crackeiras esperavam seus clientes, as
pesquisadoras seguiram pistas
deixadas por usuários atendidos
pelo Cebrid. O passo seguinte foi
convencê-las a dar entrevistas.
"São mulheres sem horários para
se prostituir. Elas se prostituem
na hora da "fissura'", diz Nappo.
As entrevistadas não foram
submetidas a exame de HIV. Mas
quatro disseram que eram portadoras do vírus. Para a pesquisadora, a maior dificuldade em
atraí-las foi a "paranóia" que
apresentam os usuários do crack.
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