São Paulo, sábado, 4 de julho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Médicos temem que pacientes parem tratamento devido aos efeitos colaterais dos remédios
Coquetel traz riscos que assustam

PRISCILA LAMBERT
da Reportagem Local

Médicos e ativistas que trabalham com portadores do vírus HIV temem que os efeitos colaterais do coquetel anti-Aids faça com que pacientes desistam de se beneficiar do tratamento.
"Precisamos evitar o pânico. Os riscos que o coquetel pode trazer ainda são menores que os benefícios", diz o infectologista Eduardo Sprinz, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (RS).
Relatos médicos recentes apontam para a ocorrência de uma lipodisfunção -alteração no metabolismo de gorduras- em pacientes usuários de inibidores de protease (componente do coquetel mais eficaz no controle da carga viral).
Algumas pessoas passaram a ter barrigas grandes, enquanto pernas, braços e rostos ficaram muito finos. Outros desenvolveram um depósito de gordura na nuca, que ficou conhecido com "corcova de búfalo".
Mário Scheffer, diretor do Grupo Pela Vidda, entidade que trabalha com orientação e apoio aos portadores de HIV, afirmou que a entidade tem convidado profissionais para fazer esclarecimentos aos soropositivos.
"Ainda não há um temor coletivo, mas uma certa frustração. Os pacientes vêem que o medicamento não é aquela maravilha. Além do mais, fica uma incógnita em relação aos efeitos que pode trazer a longo prazo", diz.
Apesar de não haver levantamentos sobre a incidência desses efeitos, médicos brasileiros afirmam que os pacientes com esses quadros ainda são minoria.
O infectologista João Mendonça da Silva, chefe do Departamento de Moléstias Infecciosas do Servidor Público de São Paulo, teve de usar seu poder de persuasão para convencer uma paciente a não interromper o tratamento.
"Seus seios estão aumentando e seus braços, pernas e quadris estão diminuindo de tamanho. Ela queria mudar a medicação com medo de perder sua feminilidade no aspecto visual."
Silva detectou lipodistrofia em apenas três dos 90 pacientes de seu consultório que tomam inibidores de protease.
De acordo com ele, enquanto os efeitos atingem apenas o aspecto estético em pequenas proporções, não há motivo para a revisão do tratamento.
O infectologista Caio Rosenthal, do Emílio Ribas, diz que entre 40% e 50% de seus pacientes desenvolveram algum tipo de efeito colateral causado pelo inibidor de protease. Segundo ele, alguns preferem não tomar o coquetel a ter seus corpos deformados. "É preocupante porque essa é a única opção de tratamento, principalmente para doentes em estado avançado."



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.