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Para Unesco, situação do professor é crítica
Relatório aponta falhas na formação, que enfatiza pouco a relação entre teoria e prática, e falta de valorização profissional
Quase a metade dos professores tem pais sem nenhuma escolaridade ou que chegaram apenas à 4ª série do ensino fundamental
DA SUCURSAL DO RIO
Num dos mais completos relatos já feitos sobre a situação
do professor brasileiro, a Unesco aponta que a situação é bastante crítica, e não apenas por
causa dos baixos salários.
Além de a carreira, que emprega 2,8 milhões de pessoas no
país, não ser atrativa para os jovens de maior nível socioeconômico, os alunos que ingressam em cursos de pedagogia e
licenciaturas recebem uma formação que enfatiza pouco a relação entre teoria e prática.
Eles se formam principalmente em instituições particulares, à noite, e poucos passam
por atividades de estágio bem
coordenadas antes de começarem a dar aulas.
Para mostrar esse quadro
complexo, as pesquisadoras da
Fundação Carlos Chagas Bernadette Gatti e Elba Barretto
usaram várias bases de dados
sobre professores no país.
Escolaridade
Do questionário que é aplicado aos alunos que fazem o Enade (exame que avalia a educação superior), elas destacaram,
entre outros fatos, que os universitários de cursos de licenciatura e pedagogia vêm de famílias mais pobres, com menor
bagagem cultural.
Quase metade (50,6%) tem
pais sem nenhuma escolaridade ou que chegaram apenas à 4ª
série do ensino fundamental.
Entre alunos dos cursos de medicina, por exemplo, esse percentual é de 7,1%. Na carreira
de enfermagem, a proporção é
de 37,7%.
"São jovens em ascensão social, e é preciso aproveitar o potencial deles, que buscam na
universidade enriquecer sua
bagagem sociocultural. Para isso, no entanto, é fundamental
mexer nas grades curriculares
dos cursos que formam professores, que deixam muito a desejar", diz Bernadette Gatti.
Para chegar a essa conclusão,
o relatório detalha uma pesquisa da Fundação Carlos Chagas,
feita com apoio da Fundação
Victor Civita, que analisou a estrutura curricular e as ementas
de 165 cursos de pedagogia e licenciaturas.
Num trecho do relatório, as
autoras destacam que as
"ementas dos cursos frequentemente expressam preocupação com o porquê ensinar, o
que pode contribuir para evitar
que conteúdos se transformem
em meros receituários, mas só
de forma muito incipiente registram o quê e como ensinar."
A proporção de horas dedicadas a formação específica, por
exemplo, não passa de 30%
nesses cursos.
"A formação é precária, com
pouca ênfase na relação entre
teoria e prática. E não há acompanhamento adequado dos estágios. Fazer isso de maneira
benfeita tem um custo alto,
pois envolve um professor designado para acompanhar cada
estudante em seu projeto. Muitas faculdades privadas não estão dispostas a arcar com isso",
critica a pesquisadora.
Salário
Célio da Cunha, assessor especial da Unesco, afirma que o
relatório deixa muito evidente
que a questão salarial é importante, mas que a valorização do
trabalho do professor não se
restringe a isso.
"Salários, apenas, não operam milagres. De que adianta
aumentar os rendimentos do
professor se ele continuar a ser
formado da mesma maneira?",
indaga Cunha.
Ele afirma que a dificuldade
de valorizar a carreira do magistério não é um desafio apenas do Brasil. No entanto, na
comparação com países desenvolvidos, os rendimentos dos
professores brasileiros ficam
muito abaixo de seus colegas
europeus, por exemplo.
"E o que agrava mais a situação dos professores brasileiros
e de outros países menos desenvolvidos é que, na Europa,
os serviços públicos de saúde e
educação são de alta qualidade,
o que não acontece no Brasil,
onde parte da renda acaba sendo destinada a suprir essa deficiência."
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