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CARTEIRADA
Documento que permite pagar 50% do ingresso em shows e cinemas é emitido sem exigência de comprovante de matrícula
UNE vende carteirinha para não-estudante
LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL
Foram necessários R$ 60 e 17
minutos dentro da loja da Blockbuster da praça Charles Müller,
em São Paulo, para duas profissionais da Folha, afastadas há
anos dos bancos escolares, diga-se, receberem carteirinhas de estudante com seus números de RG
e CPF e respectivas fotografias.
Os documentos vieram com a
logomarca da União Nacional dos
Estudantes (UNE), a assinatura
do seu presidente, Gustavo Petta,
e são garantia de um direito: o de
pagar meia entrada em cinemas,
shows e bilheterias de teatro.
Também franqueiam acesso a
descontos em 4.500 lojas.
No script oficial da venda das
carteirinhas, a coisa deveria funcionar assim: estudante preenche
formulário de solicitação, junta
uma foto 3x4, cópia de RG e do
comprovante de matrícula, paga
taxa de R$ 30 e leva carteirinha.
No estande na Blockbuster, a
realidade foi diversa. Bastou à reportagem preencher a mão, na
hora, o formulário, inventando
que cursava o segundo ano de
uma suposta pós-graduação em
semiótica na Fiam, entregar foto,
os R$ 30 e pronto. O rapaz não pediu identidade nem um comprovante de matrícula (nem para
ver). As carteirinhas expedidas
são válidas até março de 2007.
A modalidade de carteirinha da
UNE assim comercializada resulta de um convênio com a rádio Jovem Pan. No ano passado, inicial
da parceria, foram vendidas 150
mil carteiras. Neste ano, a meta é
300 mil vendas, com faturamento
bruto de R$ 9 milhões. Em cinco
anos, prevê o plano de negócios, o
objetivo é expedir 1 milhão.
Estandes de venda já estão instalados em mais de 400 locais, entre os quais se contam cinco lojas
da rede Blockbuster, 50 endereços
da Central de Intercâmbio, 38 lanchonetes McDonald's da Grande
São Paulo e Campinas, além de
sedes da própria rádio Jovem Pan.
O slogan é direto: "Economizar
é fácil! Pague menos em mais lugares". No www.estudantejp.com.br,
relacionam-se mais de
4.500 estabelecimentos conveniados, que oferecem descontos a
quem tem a carteirinha da UNE.
Mas o maior chamariz é poder
pagar meia entrada nos cinemas,
teatros e shows, um direito assegurado por leis diversas desde os
anos 30. Atualmente, apenas entidades estudantis e instituições de
ensino fundamental, médio e superior podem expedir os cartões.
Segundo o tesoureiro da UNE, o
estudante de história da UFMT
Rovilson Portela, 26, toda a operação corre por conta da Jovem
Pan. "A gente só fiscaliza." Para
ceder o nome, UNE e Ubes recebem R$ 4 por carteira. Todos os
custos operacionais correm por
conta da rádio e de seus parceiros.
Nos cinemas de três shopping
centers de São Paulo, na última
sexta, os bilheteiros informavam
que de 50% a 80% dos ingressos
são vendidos com meia entrada.
Segundo exibidores de cinema, o
preço cheio do ingresso poderia
ser reduzido em até 30% se a meia
entrada fosse mais criteriosa.
O tesoureiro da UNE minimiza
o problema. Diz que, em um ano
de parceria, houve 30 denúncias;
quatro teriam sido confirmadas.
Paulo Renato Della Volpe, 42,
sócio da Central de Intercâmbio,
parceira no negócio, diz que menos de 0,5% das carteirinhas expedidas no ano passado (algo como 750 em 150 mil) tiveram problema. "O que houve com vocês é
a exceção das exceções. A gente
mantém 15 pessoas verificando o
tempo todo o procedimento."
Por ironia, a sede da Central de
Intercâmbio fica na praça Charles
Müller e é quase vizinha de porta
da Blockbuster onde a Folha esteve. Procurados, representantes da
Jovem Pan não foram localizados.
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