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Governo quebra patente e ameaça outros remédios
Presidente diz que repetirá a medida se laboratórios praticarem preços injustos
Ministério estima economizar US$ 30 mi em 2007 com a quebra da patente do Efavirenz, remédio utilizado no tratamento da AIDS
EDUARDO SCOLESE
LEILA SUWWAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em cerimônia no Palácio do
Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decretou ontem a primeira quebra de patente de um medicamento no
Brasil -o Efavirenz, do laboratório americano Merck
Sharp&Dohme, usado no tratamento da AIDS -e ameaçou repetir a medida com outros fabricantes se considerar que os
preços praticados são injustos.
O governo pretende importar cópias não-patenteadas do
remédio, fabricadas por três laboratórios da Índia, e estima
economizar US$ 30 milhões
em 2007 com a troca. Diz que
não há perda de qualidade ou
risco de desabastecimento.
"[É] um passo importante.
Vale para este remédio, mas para tantos outros quanto necessário", disse Lula. "Se não tiver
com os preços justos, não apenas para nós, mas para todo ser
humano no planeta que está infectado, temos que tomar essa
decisão. Afinal de contas, entre
o nosso comércio e a nossa saúde, vamos cuidar da nossa saúde", disse, sob aplausos e urros
de funcionários ou profissionais ligados ao programa DST/
Aids do governo.
Após a cerimônia, o ministro
José Gomes Temporão (Saúde)
disse que no momento não há
outros remédios sob ameaça de
licenciamento compulsório.
Para ele, o país continuará
tendo "uma relação aberta,
transparente e franca" com todos os laboratórios fornecedores e garantiu que não há uma
lista de "próximos" para o licenciamento compulsório.
Na realidade, o licenciamento afeta duas patentes, a do Efavirenz (expira em 2012) e a de
um componente do processo
de fabricação (2016).
O licenciamento vale até
2012 mas pode ser prorrogado.
O governo não poderá comercializar os remédios importados dos laboratórios indianos
Ranbaxy, Cipla e Aurobindo.
Poderá apenas distribuí-los em
seus programas de saúde.
O governo tentou pressionar
a Merck a reduzir o preço do
Stocrin (nome de marca do
Efavirenz) de US$ 1,59 para
US$ 0,65 (comprimido de
600mg). As negociações começaram em novembro de 2006.
Em 24 de abril, portaria declarou o "interesse público" do remédio. Na sexta passada, houve
uma contraproposta de 30%,
que não foi considerada "séria".
A exigência era 60%.
A ameaça de quebra já rendeu descontos em dois antiretrovirais (que inibem a multiplicação do HIV). Em 2001, José Serra (PSDB), então ministro, ameaçou quebrar a patente
do Nelfinavir da Roche. Em
2003, Humberto Costa (PT)
usou a mesma estratégia com o
Kaletra, da Abbott.
O Efavirenz é distribuído hoje a cerca de 75 mil pacientes
gratuitamente, e o custo programado antes da quebra da patente era de US$ 42 milhões.
A quebra da patente foi comemorada por uma claque eufórica, que até cantou o Hino
Nacional, no evento do Palácio.
Em seu discurso, Lula disse
que o governo tomou todos os
cuidados na elaboração da medida a fim de evitar uma punição por parte da OMC (Organização Mundial do Comércio).
O Brasil sustenta que a patente continua respeitada porque haverá pagamento de 1,5%
de royalties para Merck -exigência que consta do acordo
Trips, de propriedade intelectual, da OMC para casos de licenciamento compulsório em
situações de emergência nacional ou interesse público.
"O Brasil não pode ser tratado como se fosse um país que
não merece ser respeitado, ou
seja, pagarmos US$ 1,60, quando o mesmo remédio é vendido
para outro país a US$ 0,60",
disse Lula. "É um desrespeito.
Como se o doente brasileiro
fosse inferior ao da Malásia."
O governo diz que países desenvolvidos também já fizeram
o licenciamento compulsório.
Seria o caso da Itália, que quebrou patente de três remédios
(para hipertrofia de próstata,
enxaqueca e um antibiótico).
No caso de antiretrovirais,
Tailândia, Malásia, Indonésia e
Moçambique já quebraram patentes, mas houve retaliações.
Lula e Temporão também
criticaram governos passados,
sem citar nomes, pela "destruição da indústria farmo-química
de base" durante o final dos
anos 80 e os anos 90.
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