São Paulo, domingo, 05 de junho de 2005

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CERCO AÉREO

Quadrilhas trazem armamentos por terra ou pelo Nordeste para evitar ter aviões derrubados na fronteira

Lei do Abate muda rota do tráfico de armas

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Com a entrada em vigor da Lei do Abate, contrabandistas que atuam no Brasil criaram pelo menos duas rotas alternativas para trazer armamentos para o país.
O diagnóstico foi feito por parlamentares que participam da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Câmara dos Deputados que investiga o tráfico de armas no Brasil. Uma pesquisa feita pela ONG Viva Rio estima que haja no país cerca de 4 milhões de armas nas mãos do crime organizado -são 17,3 milhões no país.
Sancionada em 1998 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso e regulamentada em julho de 2004 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei do Abate autoriza, desde outubro passado, a derrubada de aeronaves consideradas suspeitas que entram no território brasileiro.
Pela lei, são consideradas suspeitas as aeronaves que não têm plano de vôo aprovado e que são oriundas de regiões reconhecidamente fontes de produção e distribuição de drogas ilícitas, como os vizinhos Paraguai, Bolívia, Peru e Colômbia. Até agora, nenhum avião foi derrubado.
A partir da informação dos depoentes da CPI, os deputados conseguiram identificar o que seriam as novas rotas. Uma delas, também utilizadas pelos traficantes de drogas, mudou a forma de entrada das armas que chegam pela Bolívia e pelo Paraguai.
Segundo o presidente da CPI, Moroni Torgan (PFL-CE), com o risco de terem seus aviões interceptados na fronteira, os contrabandistas trazem armas do Paraguai e da Bolívia em picapes ou veículos de pequeno porte.
Os veículos percorrem a região de fronteira seca dos Estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Rondônia e param em campos de pouso de grande movimentação de cidades fronteiriças, como Ponta-Porã (MS), que teria, segundo Torgan, representantes dos 20 maiores produtores de armas do mundo.
Dali, usam aviões para levar a carga para o Rio e São Paulo. Assim, ficam livres da fiscalização.
A segunda nova rota identificada é pelo Suriname. Em vez de entrar por via aérea pela fronteira com o Brasil, os traficantes seguem de avião até o oceano Atlântico. Dali percorrem o litoral do Nordeste e entram no país por algum ponto da região. Esses locais estão sendo investigados.
Em seguida, param em pontos estratégicos normalmente a 200 km da costa e organizam a distribuição em grandes centros.
"Essa rota facilita a entrada porque o Brasil não tem poder sobre o espaço aéreo do Atlântico, considerado internacional. Além disso, as aeronaves que entram no Nordeste não são consideradas suspeitas", afirmou Torgan.
O chefe da Divisão de Combate ao Tráfico Ilícito de Armas da Polícia Federal, delegado Vantuil Cordeiro, confirmou a mudança de estratégia dos traficantes.
Embora não tenha revelado dados, ele disse que as armas estão entrando no país por via terrestre, mas no chamado tráfico "formiguinha" -em pequenas cargas.
Segundo Cordeiro, um dos indícios da mudança de rota foi a apreensão de um arsenal da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) em abril, em Osasco (SP).
Havia cerca de 20 armas, entre pistolas e escopetas, mais de mil munições de calibres variados e uma mira telescópica. Todo o material, segundo Cordeiro, veio do Paraguai por via terrestre.
A PRF (Polícia Rodoviária Federal) tem uma outra visão sobre o assunto. Segundo dados da corporação, as apreensões de armas em rodovias federais entre janeiro e maio deste ano não aumentou em relação a 2004. A média de apreensões permaneceu em três por dia. Para a PRF, os grandes carregamentos chegam pelo mar.
O delegado Cordeiro afirmou que, pela ordem, as armas entram no Brasil com maior frequência pelo Paraguai, Uruguai (principalmente pelas cidades fronteiriças de Chuí e Guaraí, no RS), Argentina e, em quarto, Bolívia.
Sobre a rota do Suriname, Cordeiro afirmou que não é só de entrada, mas também de saída de armas. Segundo ele, traficantes brasileiros vão até o país sul-americano trocar armamentos por drogas com colombianos.
Segundo Torgan, pelo Suriname chegariam preferencialmente as armas produzidas na Europa, como o fuzil russo AK-47 e metralhadoras antiaéreas da Ásia.
Já o fuzil AR-15, norte-americano, estaria vindo de Miami (EUA) em aviões comerciais.

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