São Paulo, domingo, 05 de julho de 2009

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DANUZA LEÃO

Glamour, para esquecer o Senado


Não há nenhum costureiro que faça um vestido de noite que chegue aos pés dos que fazia St. Laurent

OUTRO DIA fui ver a exposição de St. Laurent no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio, e fiquei boquiaberta com as coisas que vi. Não foi uma surpresa, pois sempre acompanhei o trabalho do mais talentoso de todos os costureiros que já existiram, mas como ando meio desligada da moda, havia esquecido das maravilhas criadas por St. Laurent ao longo de 40 anos.
Ninguém vai negar o mérito de Balenciaga, Chanel ou Dior, mas, no fundo, eles copiavam a si próprios a cada coleção -exceto quando Dior criou o "new look". Já St. Laurent buscou inspiração na África, na Rússia, na Espanha, no Marrocos, na Ásia e nem sei mais em que outras culturas e adaptou-as a seu modo, cada uma mais linda que a outra. E mais: enquanto os outros costureiros ficavam no preto, branco, bege, cinza, marinho, e mais ou menos só, St. Laurent ousou colorir o universo feminino, misturando cores que nunca ninguém, em seu maior delírio, teria coragem de ousar. Rosa-choque com vermelho, roxo com amarelo, laranja com verde -não, o mundo nunca havia visto isso antes.
E inventou o smoking para as mulheres, o que mudou todo o conceito de como se vestir elegantemente à noite; foi o supra-sumo de um achado simples e audacioso, o preferido do costureiro. Em uma entrevista, St. Laurent disse que a única coisa que lamentava em sua vida era não ter inventado o jeans. Só um gênio como St. Laurent diria isso.
Depois de ter visto a exposição, fui ver o vídeo que é um apanhado de todo o seu trabalho, e a tristeza do final, quando ele, já mal de saúde, fragilizado, vai à passarela pela mão de sua grande amiga Catherine Deneuve; nada a ver com o garoto que aos 19, 20 anos tomou o lugar daquele que até então era o maior de todos, Dior. E depois, no mesmo vídeo, uma bela entrevista do tímido, sensível e genial costureiro.
E fiquei pensando nesse -aliás, naquele- mundo de sofisticação, glamour e luxo que não existe mais.
Não há nenhum costureiro que faça um vestido de noite que chegue aos pés dos que fazia St. Laurent; apesar de nunca ter pertencido verdadeiramente a esse mundo, andei perto dele, e sabia do que acontecia nos salões. Grandes festas eram oferecidas por milionários como o rei do estanho, Antenor Patiño, originário de um país tão pobre como a Bolívia, o triliardário mexicano Charles de Bestegui, nascido em um país na época tão pobre quanto o México, e o também riquíssimo chileno Arturo Lopez, todos conhecidos por seus bailes em Paris, em Veneza e em Estoril, que ficaram na história do jet-set. Eram todos temáticos; ou um baile de máscaras, ou oriental, ou recordando Proust, cada um com mais de mil convidados, todos vipérrimos, atrizes internacionais, magnatas poderosos, e nobres, muitos nobres. Um jornal da época fez um delicioso comentário: "submersos num mar de tanta aristocracia, nem se pode compreender como existem tantas Repúblicas".
A exposição de St. Laurent me fez viajar no tempo e lembrar destas festas inacreditáveis que eu, apesar de não tê-las frequentado, soube como eram por amigos que tinham ido. E percebi, mais do que nunca, o que já sabia: que o mundo mudou, e para sempre. Nunca mais haverá um St. Laurent -comparem uma foto dele, sempre elegantíssimo, usando gravata mesmo quando trabalhando no seu ateliê, com uma de Galliano, de lenço de pirata e brincos.
Nunca mais acontecerão bailes como aqueles, nem haverá mulheres tão bonitas e glamourosas como Audrey Hepburn ou Jerry Hall, tudo isso acabou. Quem viu viu, quem não viu soube, e quem nunca viu nem soube vai morrer sem ter visto e sem saber.
E não compreendo que no ano da França no Brasil uma exposição tão importante tenha sido mostrada apenas no Rio, quando teria a obrigação de ter ido também para São Paulo. Uma bela pisada na bola de parte dos organizadores.

danuza.leao@uol.com.br


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