São Paulo, segunda-feira, 05 de agosto de 2002

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TRANSPORTE

Número dos que vão ter de fazer baldeação dobra a partir de julho de 2003, mudança que preocupa os especialistas

48% terão que usar mais de uma condução

Patrícia Santos/Folha Imagem
Movimentação de passageiros no terminal Santo Amaro (zona sul de SP); com novo modelo, número dos que farão baldeação irá dobrar


ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

A quantidade de passageiros que utiliza mais de uma condução para se deslocar dentro de São Paulo vai dobrar a partir de julho de 2003. E os paulistanos não terão uma rede integrada entre ônibus, lotações, metrô e trem.
Essas características são as que mais preocupam os especialistas no novo modelo de transporte coletivo que a administração Marta Suplicy pretende implantar no ano que vem e cuja licitação foi lançada na semana passada.
As projeções da Secretaria dos Transportes mostram que praticamente metade dos usuários (48%) terá que usar mais de um meio de transporte na mesma viagem -hoje, esse índice é de 25%.
O crescimento das baldeações vai acontecer por causa da extinção de 46% das atuais 1.576 linhas de ônibus e lotações da capital paulista. A idéia é acabar com os trajetos longos, que atravessam diversos bairros em direção ao centro expandido, racionalizando os custos do transporte.
Por exemplo, a linha 6957, Jardim das Fontes-Metrô Praça da Árvore, na zona sul, que roda 86 km no trajeto de ida e de volta -distância suficiente para ir de São Paulo ao Guarujá, no litoral sul do Estado.
O desafio é fazer com que os minutos a mais gastos na baldeação não aumentem a duração da viagem -e que os passageiros não paguem mais caro pela utilização de duas ou mais conduções.

Questão política
Embora preocupante, essa característica é considerada um "risco necessário". Já a falta de uma integração efetiva entre ônibus, lotações, metrô e trem é vista como uma questão política.
O modelo proposto pela Prefeitura de São Paulo prevê a criação de um bilhete único, um cartão magnético por meio do qual os passageiros poderão fazer as integrações entre ônibus e lotações. Evita-se, dessa forma, a utilização de dinheiro, passes e vales-transporte, dando mais agilidade ao sistema e facilitando a redução do preço para quem utiliza mais de uma condução.
A falha apontada por técnicos é a exclusão das redes de metrô e trem -usadas por 3,7 milhões de passageiros nos dias úteis, demanda igual à dos ônibus municipais- por falta de acordo entre governo do Estado e prefeitura.
As gestões Geraldo Alckmin (PSDB) e Marta Suplicy (PT) chegaram a combinar em 2001 a criação de dois cartões diferentes, mas com tecnologias compatíveis, para facilitar as integrações.
O bilhete único do Estado, porém, ainda deve demorar dois anos para ficar pronto, segundo Jurandir Fernandes, secretário dos Transportes Metropolitanos.
E, até agora, não houve acordo entre as partes para que os passageiros que usam os sistemas na mesma viagem tenham algum desconto na passagem final.

Vantagem
O atual prefeito de Curitiba, Cassio Taniguchi (PFL), participou nos anos 70 da implantação de um modelo semelhante à proposta de Marta, que existe até hoje na capital do Paraná. "A vantagem é a frequência maior dos ônibus e a integração da tarifa. O transbordo é a desvantagem. O passageiro reclama um pouco por ter que sair de um veículo e entrar em outro", afirma Taniguchi.
Ailton Brasiliense, diretor da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), defende as baldeações. "Não há condição de pegar os passageiros na porta de casa e levar todo mundo ao destino com uma só condução. A lógica, para baixar os custos, é fazer um sistema estruturado."
Ele ressalva que a prefeitura terá que garantir uma compensação. "A mudança só se justifica se for para ganhar no tempo de viagem", afirma Brasiliense, reconhecendo que haverá reclamações entre os que passarão a utilizar mais de um transporte.
"Sim, vai ter gente insatisfeita, mas não há alternativa. A compensação é trocar um sistema moroso, inconfiável, por um mais rápido, mais confiável. Você perde na baldeação, mas ganha no tempo de espera e na tarifa", diz.
A falta de integração dos ônibus com as redes de trem e metrô é citada como uma deficiência. "Não é mais uma questão tecnológica, mas de um compromisso político, de um conjunto de prefeitos e do governador. Não há a menor lógica eu ter dois, três ou quatro sistemas", afirma Brasiliense, que espera a criação de um bilhete único da região metropolitana.
Laurindo Junqueira, ex-secretário dos Transportes de Santos e de Campinas, aponta essa "falta de conversa" como "um enorme problema". "Há necessidade de uma integração tarifária, mas seria importante uma contrapartida da prefeitura, comprometendo-se a investir em novas linhas de metrô, até mesmo para evitar a sobrecarga da rede atual", diz.



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