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OBSTETRÍCIA
Conferência em Fortaleza debateu formas de reduzir o índice de nascimentos por cesárea, que chega a 56% no país
Modelo americano de parto é criticado em conferência
DA REPORTAGEM LOCAL
As mulheres brasileiras continuam parindo como parem as
norte-americanas. O que pode
parecer um luxo significa que
mãe e bebê estão sofrendo mais,
correndo maior risco de vida, e
que o país gastando mais do que
precisaria. O modelo americano
de parto e nascimento, considerado um dos mais medicalizados e
intervencionistas, continua vigente na grande maioria das maternidades brasileiras privadas.
A necessidade de mudança nesse modelo de assistência obstétrica foi a bandeira da Conferência
Internacional sobre Humanização do Parto e Nascimento, que
terminou neste sábado em Fortaleza (CE). Representantes de 21
países participaram do encontro
que reuniu 1.800 pessoas.
O modelo norte-americano de
parto, que já foi considerado
ideal, nunca foi adotado na Europa e no Canadá. "O alto índice de
cesáreas e a excessiva medicalização do parto aumenta a mortalidade materna e a perinatal, de bebês de até um ano", diz o obstetra
Marcos Leite dos Santos, da maternidade da Universidade Federal de Santa Catarina. Santos faz
parte da coordenação nacional da
Rehuna, Rede Nacional pela Humanização do Parto.
Segundo seus dados, os EUA
têm uma taxa de cesárea de 26%,
contra 8% na Holanda. No Brasil,
a taxa é de 56%, considerando
hospitais públicos e privados. A
grande maioria das maternidades
privadas tem taxa superior a 70%.
"Há hospitais no Estado de São
Paulo com índices de cesárea acima de 90", diz a médica Daphne
Rattner, da comissão organizadora do encontro de Fortaleza.
A taxa de cesárea é apenas um
dos itens criticado pelos que defendem o chamado parto humanizado. "Uma série de procedimentos adotados de rotina não
encontram nenhuma justificativa
médica", diz Santos. Além do desconforto para a mulher, as práticas dobram os custos do parto.
O movimento contra a medicalização do nascimento tem o
apoio da Organização Mundial da
Saúde (OMS) e vem sendo defendido pelo Ministério da Saúde. A
OMS lista uma série de práticas
que considera "danosas ou ineficazes e que devem ser eliminadas" da rotina. Entre elas estão a
raspagem dos pelos pubianos, a
lavagem intestinal e o parto deitado, sem mudanças de posição.
Também desaconselha a restrição de alimentos e líquidos durante o trabalho de parto, exames
vaginais frequentes e repetidos,
feitos por mais de um profissional
de saúde, e o uso rotineiro da episiotomia, o corte do períneo para
ampliar a vulva.
"A maioria dos hospitais adota
essas práticas com todas as gestantes", diz Santos. "Aumentam
os riscos e os desperdícios", observa Daphne.
Apesar de todos os prós, "a resistência ao parto humanizado
ainda é grande, mesmo entre os
obstetras", diz João Batista Marinho de Castro Lima, da maternidade Sofia Feldman, de Belo Horizonte. O hospital foi criado em
1982 seguindo todos os preceitos
do nascimento humanizado. Foi a
primeira maternidade brasileira a
adotar as "doulas", voluntárias
treinadas para acompanhar as
gestantes durante o parto.
Em São Paulo, o Hospital Santa
Marcelina, da zona leste, adotou
no mês passada "doulas" voluntárias treinadas.
Em outra frente, o projeto Qualis, de Saúde da Família, implantou em Sapopemba (região sudeste) a primeira Casa de Parto da rede pública, onde as mulheres dão
à luz sem a presença de médicos.
Na noite da sexta-feira, Dalvanice
Soares da Cunha, 17, se preparava
para o nascimento de Ana Carolina com duchas mornas e exercícios.
Em Recife, a ONG Curumim
acaba de publicar com o Ministério da Saúde uma cartilha destinada às parteiras tradicionais. "Só
em Pernambuco são 3.000 parteiras cadastradas", diz Paula Viana,
enfermeira, parteira domiciliar e
um das diretoras e fundadoras do
Curumim e do Rehuna.
(AURELIANO BIANCARELLI)
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