São Paulo, Domingo, 05 de Dezembro de 1999


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SAÚDE
Relatório mostra que cientista era pago por fabricante de cigarro para ser consultor da organização
OMS acusa Philip Morris de espionagem

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília

A Organização Mundial da Saúde (OMS) está de posse de documentos que, segundo sua avaliação, demonstram que a indústria de cigarros está empenhada "há décadas em minar e subverter" seu trabalho de controlar o consumo de tabaco no mundo.
A Folha teve acesso a um relatório encaminhado à diretora-geral da OMS, a norueguesa Gro Harlem Brundtland, no qual se afirma que os documentos são "apenas a ponta do iceberg em termos dos esforços" (dos produtores de cigarro) contra a organização.
Entre as acusações que constam do relatório está a de que um cientista recebia dinheiro da indústria de tabaco enquanto trabalhava como consultor da OMS.
Embora a Folha saiba o nome desse cientista, de nacionalidade italiana, não o revela hoje por não o ter localizado nas últimas três semanas na Suíça, na França (onde morou até 1992) ou na Espanha (onde trabalhava em 1998).
O relatório afirma que, no final dos anos 80, a Philip Morris, maior produtora de cigarros do mundo, adotou o "Plano de Ação de Boca Raton" para "conter, neutralizar e reorientar" a OMS.
A empresa disse à Folha (veja texto ao lado) que as decisões que constam desse plano nunca foram implementadas.
Entre elas, de acordo com o relatório em poder da Folha, estavam a "doação" de um executivo do ramo de alimentação do grupo Philip Morris para trabalhar no escritório de segurança alimentar da OMS e a deflagração de ataques à organização em meios de comunicação de massa com o fim de desacreditá-la.
O documento cita artigos publicados no jornal "The Wall Street Journal" com críticas contra a burocracia da OMS e suas políticas de alocação de recursos como parte da campanha de descrédito.

Inquérito
O relatório para Brundtland recomenda a ela que instale uma comissão de inquérito internacional, com pelo menos três especialistas em direito, para identificar conflitos de interesse que possam ter ocorrido na OMS e aprofundar a investigação sobre o que as indústrias de cigarro fizeram contra a organização.
O Plano de Boca Raton tem esse nome por causa da cidade homônima do Estado da Flórida, costa leste dos EUA, onde se realizou uma conferência internacional de executivos de assuntos corporativos da Philip Morris em 1988.
Ele previa esforços da indústria de tabaco para encorajar países-membros da OMS a questionar o uso de seus fundos no patrocínio de programas "com o objetivo de mudar o comportamento de populações em vez de melhorar o nível de saúde e as condições econômicas" dessas populações.
Entre os programas especificados, estavam campanhas para diminuir o consumo de cigarros entre mulheres e jovens.
O relatório entregue à diretora-geral da OMS transcreve correspondência trocada durante quatro anos entre o cientista italiano e a indústria de cigarros na qual é discutida sua participação em estudo sobre pesticidas usados nas plantações de tabaco.
Também há menções a documentos da Philip Morris em que um ex-diretor da OMS aparece como fornecedor de documentos da organização para a empresa e como o receptor de discursos preparados por executivos da indústria para ele pronunciar.


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