São Paulo, domingo, 06 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Vítimas do nazismo ainda lutam por reparação

Irmãos ucranianos residentes no Paraná viveram em campo de trabalhos forçados

Com documentos mostrando que a família foi submetida a condições degradantes, eles pretendem mover ação contra o governo alemão

Sergio Ranalli/Folha Imagem
Mikolay e Valentin, ucranianos que moram no PR com a foto dos pais, com quem viveram em campo de trabalhos forçados na Alemanha


JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM DOUTOR CAMARGO (PR)

A Segunda Guerra Mundial terminou há 62 anos, mas não para três irmãos ucranianos que vivem no Paraná. Eles querem indenização do governo da Alemanha por danos físicos e morais provocados pelo confinamento, por 13 meses, em um campo de concentração para trabalhos forçados.
Os irmãos Lubov, 74, Mikolay, 70, e Valentin Hluchov, 66, eram crianças quando foram levados com os pais pelos nazistas para trabalhos forçados em Papenburg (fronteira entre Alemanha e Holanda), em um campo da Klostermoor, empresa que explorava turfa (matéria esponjosa constituída de restos vegetais) para alimentar caldeiras das fábricas alemãs.
Os três, então crianças, conviveram com assassinatos de março de 1944 a abril de 1945. "Eles fuzilavam diariamente prisioneiros de guerra, a maioria poloneses e russos, a menos de 20 metros do nosso galpão", afirma Lubov, ou Lourdes, como é conhecida no Brasil.
De abril de 1945 -quando ingleses e poloneses tomaram Papenburg- até 1949, a família Hluchov viveu em cinco campos para refugiados na Alemanha, até que o governo brasileiro aceitou recebê-los. O patriarca da família, Wasil Hluchov, tinha 47 anos à época e não foi aceito pelos governos dos EUA, Canadá e Argentina.
"Lutamos para que nós e outras milhares de pessoas obrigadas a viver em campos de trabalhos forçados sejam lembradas para que isso não se repita no futuro", diz Valentin.
O advogado Wilson Quinteiro, 36, que integra o grupo Tortura Nunca Mais e advoga para ex-presos políticos brasileiros, recolhe há três anos documentos que comprovam a presença do pai Wasil e sua mulher, Szenia, no campo de trabalhos forçados em Papenburg.
"Conseguimos juntar documentos que mostram que a família foi obrigada a trabalhos forçados e viveu sob condições degradantes. O Estado alemão tem obrigação de reparar danos morais àqueles que foram vítimas do governo naquela época." Entre os documentos reunidos estão atestados da Klostermoor entregues a Wasil e Szenia após a liberação.
Os pais dos irmãos morreram no final da década de 1970, em Doutor Camargo (476 Km de Curitiba), onde vivem hoje em área rural os irmãos Valentin e Mikolay. Lubov mora em Cambé, também no Paraná.
Segundo o advogado, "o crime é imprescritível, pois enquanto perdura o dano moral persiste o direito de pretender a indenização." Quinteiro ainda prepara a ação, e procura um escritório de advocacia na Alemanha para ingressar com o pedido. O valor da indenização a ser pedido não foi decidido.
A Embaixada da Alemanha em Brasília informou que não se pronunciará oficialmente sobre a pretensão porque o governo alemão não recebeu notificação oficial sobre o caso.
Em caráter informal, o representante de imprensa da embaixada alemã em Brasília, Bernard Weidlich, disse haver precedentes de indenização para quem comprovou ter sido submetido a trabalhos forçados.
A German Forced Labour, uma fundação que indeniza prisioneiros de guerra, reconheceu, em 2003, o direito dos Hluchow à indenização. A fundação, no entanto, negou pagamento aos irmãos, sob alegação que as indenizações obedeciam outra ordem de prioridade.


Texto Anterior: Bairro tem passado mitológico de malandros e prostitutas
Próximo Texto: Após 62 anos, ruído de avião causa medo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.