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SEM HORIZONTES
Nos subúrbios do Rio, o desemprego faz com que os dias sejam ocupados com TV e música
Jovem vive entre tráfico e desemprego
FERNANDA DA ESCÓSSIA
da Sucursal do Rio
No rádio, um funk proibido pela polícia fala em matar "o vacilão
do movimento" (o informante
que entrega o traficante à polícia).
É terça-feira à tarde no conjunto
habitacional Cidade Alta, em Cordovil, subúrbio pobre da zona
norte do Rio.
Uma quadra de chão de cimento batido serve de praia para um
grupo de oito jovens com idades
entre 15 e 21 anos. Os garotos tomam sol. Um deles, com um balde, joga água nos demais. Todos
sabem de cor o funk proibido.
Não fazer nada o ano inteiro é a
rotina de 98 mil jovens de 15 a 24
anos que vivem na região metropolitana do Rio. Segundo o IBGE,
eles não estudam e nem trabalham. Outros 305 mil na mesma
faixa etária, que poderiam estar
estudando ou trabalhando, só
ajudam nos serviços de casa, como cuidar dos irmãos e fazer limpeza doméstica.
Os oito rapazes do conjunto de
Cordovil não são traficantes, mas
vivem entre as fronteiras da juventude do subúrbio carioca: desemprego, funk, violência e tráfico. Para eles, a palavra "férias"
não tem qualquer significado.
Naquela terça-feira, nenhum
deles tinha dinheiro sequer para ir
à praia em Ipanema, na zona sul:
R$ 1,60 para as passagens de ida e
volta de ônibus. O grupo fazia naquela tarde o que faz a maior parte do tempo: nada, "porque não
há nada mesmo para fazer".
No subúrbio, o Rio é outra cidade, e a juventude é diferente da
que lança moda na praia da zona
sul. Esse jovem do subúrbio,
quando vai à praia, lota o metrô,
faz barulho no ônibus e assusta a
classe média.
Por uma semana, a Folha percorreu quatro bairros dos subúrbios cariocas -Campo Grande
(zona oeste), Cordovil, Parada de
Lucas e morro do Urubu (zona
norte)- e entrevistou 30 jovens
na faixa etária de 14 a 24 anos.
A maioria deles passou à toa as
tardes de janeiro. Outros se engajaram em projetos (oficiais ou do
bairro) em busca de melhores
oportunidades de vida, mas todos
têm histórias semelhantes.
Avanço do tráfico
Quem vive nessas regiões cresce ao lado do tráfico e certamente
já perdeu um parente ou um amigo para as drogas. Os números do
Tribunal de Justiça mostram o
avanço do tráfico entre jovens: a
maior parte dos processos relacionados a tráfico de drogas (60%
do total do Estado) está na Vara
da Infância e Juventude, por onde
passam os menores infratores.
O jovem fluminense também
corre o risco de ser morto: em
1996, foi de 112,7 (por 100 mil habitantes) a taxa de homicídios na
faixa etária de 15 a 29 anos, a mais
alta do país. A média nacional é de
44,8 homicídios por 100 mil habitantes nessa faixa etária, segundo
dados do IBGE.
Entre o tráfico e o desemprego,
o jovem pobre do Rio se atrasa na
escola ou deixa de estudar. O jovem do subúrbio vê TV, mas não
lê nem vai ao cinema. Ouve muito
funk, hip hop e pagode. E sonha:
com emprego, futebol e fama.
Mas há também quem, com 18
anos, se ache velho e não sonhe
mais com nada.
A seguir, seis histórias do subúrbio do Rio.
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