São Paulo, #!L#Domingo, 06 de Fevereiro de 2000


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SEM HORIZONTES
Nos subúrbios do Rio, o desemprego faz com que os dias sejam ocupados com TV e música
Jovem vive entre tráfico e desemprego

FERNANDA DA ESCÓSSIA
da Sucursal do Rio

No rádio, um funk proibido pela polícia fala em matar "o vacilão do movimento" (o informante que entrega o traficante à polícia). É terça-feira à tarde no conjunto habitacional Cidade Alta, em Cordovil, subúrbio pobre da zona norte do Rio.
Uma quadra de chão de cimento batido serve de praia para um grupo de oito jovens com idades entre 15 e 21 anos. Os garotos tomam sol. Um deles, com um balde, joga água nos demais. Todos sabem de cor o funk proibido.
Não fazer nada o ano inteiro é a rotina de 98 mil jovens de 15 a 24 anos que vivem na região metropolitana do Rio. Segundo o IBGE, eles não estudam e nem trabalham. Outros 305 mil na mesma faixa etária, que poderiam estar estudando ou trabalhando, só ajudam nos serviços de casa, como cuidar dos irmãos e fazer limpeza doméstica.
Os oito rapazes do conjunto de Cordovil não são traficantes, mas vivem entre as fronteiras da juventude do subúrbio carioca: desemprego, funk, violência e tráfico. Para eles, a palavra "férias" não tem qualquer significado.
Naquela terça-feira, nenhum deles tinha dinheiro sequer para ir à praia em Ipanema, na zona sul: R$ 1,60 para as passagens de ida e volta de ônibus. O grupo fazia naquela tarde o que faz a maior parte do tempo: nada, "porque não há nada mesmo para fazer".
No subúrbio, o Rio é outra cidade, e a juventude é diferente da que lança moda na praia da zona sul. Esse jovem do subúrbio, quando vai à praia, lota o metrô, faz barulho no ônibus e assusta a classe média.
Por uma semana, a Folha percorreu quatro bairros dos subúrbios cariocas -Campo Grande (zona oeste), Cordovil, Parada de Lucas e morro do Urubu (zona norte)- e entrevistou 30 jovens na faixa etária de 14 a 24 anos.
A maioria deles passou à toa as tardes de janeiro. Outros se engajaram em projetos (oficiais ou do bairro) em busca de melhores oportunidades de vida, mas todos têm histórias semelhantes.

Avanço do tráfico
Quem vive nessas regiões cresce ao lado do tráfico e certamente já perdeu um parente ou um amigo para as drogas. Os números do Tribunal de Justiça mostram o avanço do tráfico entre jovens: a maior parte dos processos relacionados a tráfico de drogas (60% do total do Estado) está na Vara da Infância e Juventude, por onde passam os menores infratores.
O jovem fluminense também corre o risco de ser morto: em 1996, foi de 112,7 (por 100 mil habitantes) a taxa de homicídios na faixa etária de 15 a 29 anos, a mais alta do país. A média nacional é de 44,8 homicídios por 100 mil habitantes nessa faixa etária, segundo dados do IBGE.
Entre o tráfico e o desemprego, o jovem pobre do Rio se atrasa na escola ou deixa de estudar. O jovem do subúrbio vê TV, mas não lê nem vai ao cinema. Ouve muito funk, hip hop e pagode. E sonha: com emprego, futebol e fama. Mas há também quem, com 18 anos, se ache velho e não sonhe mais com nada.
A seguir, seis histórias do subúrbio do Rio.


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