UOL


São Paulo, quinta-feira, 06 de fevereiro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TRANSPORTE

SPTrans diz ter suspendido pagamento de R$ 5.600 após assumir empresa; suposta carta de Niquini comprovaria ligações

Sindicalista é acusado de ser pago por patrão

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um diretor de garagem do sindicato dos motoristas e cobradores de ônibus de São Paulo recebia R$ 5.600 mensais do empresário Romero Teixeira Niquini, valor incompatível com as suas funções dentro da viação Santa Bárbara, segundo informações da SPTrans (São Paulo Transporte, órgão da prefeitura que cuida do setor).
O "salário" foi suspenso em setembro de 2002, quando as empresas de Niquini tiveram seus contratos rompidos e passaram a ser administradas por equipes da SPTrans. O diretor do sindicato que seria beneficiado, Edvaldo Gomes de Oliveira, conhecido por Dentinho, nega a acusação e diz que ela é uma "armação".
As informações da SPTrans foram passadas após a Folha obter uma carta, supostamente assinada por Niquini, que poderia comprovar as ligações entre patrão e sindicalista -setores acusados pela prefeitura e pelo Ministério Público do Trabalho de terem articulado uma greve de ônibus de dois dias nesta semana.
Na carta, que foi entregue em outubro passado a Wagner Ramos, funcionário da SPTrans que administra a viação Santa Bárbara, Niquini informa ter pago R$ 5.600 mensais a Dentinho "para fazer frente aos gastos para o bom desempenho de suas funções de representante sindical".
A assinatura de Niquini na carta é semelhante à de outro documento assinado pelo empresário, referente às mudanças em uma empresa de lixo adquirida por ele em Belém (PA). Niquini está na Espanha. Funcionários de seu escritório disseram não ser possível localizá-lo e não souberam dizer se a carta é verdadeira.
Segundo a SPTrans, os funcionários públicos que assumiram a viação Santa Bárbara detectaram esse pagamento, que foi suspenso imediatamente por ser incompatível com as funções de Dentinho.
No mês seguinte, a suspensão da "ajuda de custo de representante sindical" teria sido contestada por Dentinho, que teria obtido a suposta carta de Niquini para tentar garantir esse pagamento.
A carta foi desconsiderada pela SPTrans, que avaliou não haver sustentação jurídica nem administrativa para manter esse desembolso ao sindicalista.

Fraude
Dentinho é diretor do sindicato na garagem da viação Santa Bárbara há sete anos. O empresário Niquini controlava mais de 10% da frota de ônibus paulistana, mas teve seus contratos rompidos em setembro de 2002 sob a acusação de ter cometido fraude na prestação de contas da arrecadação -teria informado à SPTrans uma quantidade de vales-transporte arrecadados inferior à contagem oficial dos trabalhadores.
Desde então, os veículos e as viações dele estão sob controle da administração Marta Suplicy.
O militante do PT William Ali Chaim, presidente do grupo Niquini na época, disse à Folha não ter conhecimento da suposta carta nem de algum pagamento a Dentinho a cargo de "ajuda sindical". "Não sei de nada", afirmou.
O grupo Niquini era conhecido pelos constantes atrasos no pagamento de salários a motoristas e cobradores.
Para exercer as funções de diretor do sindicato na garagem da Santa Bárbara, Dentinho diz receber um salário mensal de R$ 1.000. Ele é responsável pelas negociações com os patrões e pela mobilização dos motoristas e cobradores nessa viação.
Além da remuneração paga pela entidade, Dentinho afirma receber seu salário de motorista na Santa Bárbara. Com as duas rendas, diz ganhar R$ 2.500 por mês. O piso salarial dos motoristas está hoje em torno de R$ 1.000.
Ontem à tarde, ao ser abordado pela Folha na garagem da Santa Bárbara, ele dirigia um Gol vermelho, ano 2001.
Dentinho disse que, além do carro, tem como patrimônio só mais uma casa. "Se eu recebesse esse valor [R$ 5.600", meu carro teria ar-condicionado", afirmou.
A reportagem também abordou Wagner Ramos, funcionário da SPTrans que recebeu a suposta carta de Niquini, para saber detalhes do pagamento, mas ele afirmou não poder se manifestar.
Segundo a Folha apurou, funcionários da SPTrans preferiram não divulgar os pagamentos a Dentinho feitos em 2002 por ter receio da reação do sindicato dos condutores. A empresa informou ontem apenas que "não interfere nas relações de trabalho" entre patrões e empregados.
O Transurb (sindicato das viações) e diretores do sindicato dos motoristas foram procurados no final da tarde de ontem para comentar a situação de Dentinho, mas não houve resposta. Foram deixados recados nos celulares de Edivaldo Santiago e Geraldo Diniz, presidente e diretor do sindicato, respectivamente.


Texto Anterior: Há 50 anos
Próximo Texto: Outro lado: "Carta pode ser uma armação", afirma Dentinho
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.