São Paulo, sábado, 06 de março de 2004

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ADMINISTRAÇÃO

Sentença é a primeira dada em série de ações da Promotoria; cessões por décadas têm contrapartidas mínimas

Juiz manda escola desocupar área pública

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Justiça paulista acaba de dar a primeira sentença que determina a desocupação de uma das mais de 200 áreas públicas municipais entregues a instituições particulares há décadas de graça ou mediante contrapartidas mínimas.
A decisão do juiz Guilherme de Souza Nucci, da 9ª Vara da Fazenda Pública, que pode ser alvo de recurso, atinge um dos mais tradicionais colégios da capital: a Fundação Liceu Pasteur.
A instituição ocupa um enorme quarteirão entre as ruas Cel. Lisboa e Mayrink, na Vila Mariana, região nobre da zona sul. Mas exatos 2.567,5 m2 desse terreno são da Prefeitura de São Paulo.
A área foi cedida ao Liceu em 1974, por 50 anos, pelo então prefeito Miguel Colassuono. Em contrapartida, coube à instituição garantir a manutenção do terreno e nele "construir a instalação necessária à prática de esportes".
Lá surgiram, então, quadras, piscinas e um campo de futebol. Com eles em funcionamento, o termo de concessão foi aditado, em 1982, passando a figurar entre as obrigações da fundação deixar tais instalações "à disposição da administração municipal para competições programadas".
Na ação, no entanto, a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo afirma que o complexo é utilizado apenas para aulas de educação física dos alunos, que pagam mensalidades de até R$ 860. "O Liceu Pasteur, portanto, aufere lucro com as áreas municipais", escreve o promotor Carlos Alberto Amin Filho, autor da ação. Nem o Liceu nem a prefeitura informaram, ontem, quantas vezes as instalações do colégio foram usadas a pedido do governo.
A sentença judicial que determina a desocupação imediata do terreno está datada de 5 de fevereiro, mas só chegou ontem ao cartório da 9ª Vara, após conhecimento do Ministério Público.
O Liceu deve ser notificado da decisão na semana que vem. A partir de então, estará sujeito a uma multa de R$ 5.000 por dia de utilização da área. Depois, a Justiça fixará uma indenização aos cofres públicos pela exploração do terreno durante quase 30 anos.
O caso do Liceu Pasteur é o primeiro a ter desfecho em primeira instância, mas há ao menos outras 20 ações na Justiça paulista contra instituições privadas instaladas sobre terrenos municipais -a maior parte delas, clubes esportivos.
As ações começaram depois que uma CPI da Câmara Municipal deu 180 dias para o governo iniciar a revisão das contrapartidas e o processo de reintegração de posse das áreas. O prazo terminou em abril de 2002, mas nada foi feito, segundo os promotores.
Apesar de numerosas, as ações ainda não atingem nem sequer 10% das cessões. Em 2002, o relatório anual de áreas públicas publicado no "Diário Oficial" apontava a existência de 213 terrenos cedidos: 102 permissões gratuitas e 39 onerosas -por tempo indeterminado- e 72 concessões que chegam a durar 99 anos.
Ao todo, eles somam 1,42 km2 -quase o dobro do que ocupam os 39 empreendimentos do Projeto Cingapura. Se fossem alugados, poderiam render por ano R$ 47,78 milhões (8% do valor estimado dos imóveis) -o suficiente para atender, durante um ano, 36 mil famílias no Renda Mínima.
A prefeitura afirma que tentará efetuar a cobrança dos aluguéis ou vender as áreas. Já as entidades que ocupam os terrenos sustentam que eles só têm hoje altos valores de mercado porque elas lá investiram e impediram invasões.


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