São Paulo, terça-feira, 06 de abril de 2004

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EDUCAÇÃO

Auditoria do Censo Escolar de 2003 revelou que Estados e municípios inflaram alunos e até fraudaram o Fundef

MEC cassa 283 mil matrículas irregulares

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Auditoria feita pelo Ministério da Educação nos dados do Censo Escolar do ano passado descobriu 283 mil matrículas irregulares no ensino fundamental. Esse é o número de estudantes que "sumiram" das estatísticas do momento em que foram divulgados os dados preliminares (em agosto do ano passado) até a publicação dos dados oficiais, que passaram a contar no cálculo de recursos de diversos programas a partir de janeiro deste ano.
Na semana passada, o ministério iniciou o processo de contagem de alunos do censo deste ano. O MEC, por meio do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), faz essas auditorias para tentar evitar que prefeituras e Estados informem no Censo Escolar um número irreal de alunos.
Como há vários programas do ministério em que o cálculo do repasse de recursos para Estados e municípios leva em conta o número de alunos do censo, uma forma de obter mais recursos é orientar diretores de escola a informar um número maior de alunos do que o real.
O mais conhecido desses programas é o Fundef (fundo que estabelece um gasto mínimo por aluno no ensino fundamental), que repassa R$ 537,71 por ano por aluno de ensino fundamental da rede pública de 1ª a 4ª série e R$ 564,60 por aluno de 5ª a 8ª série.
O número de matrículas "cassadas" neste ano é bastante superior ao de 2001 e 2002. Em 2001, a diferença entre a divulgação preliminar e a oficial foi de 77.551. Em 2002, esse número subiu para 90.932. De 2002 para 2003, houve um aumento de 211%. O Censo Escolar do ano passado foi o primeiro realizado integralmente pelo PT no governo federal.
A modalidade de fraude mais comum é matricular alunos da rede de educação de jovens e adultos no ensino fundamental regular (destinado a estudantes dos 7 aos 14 anos). A educação de jovens e adultos também recebe recursos por aluno contabilizado no censo (R$ 250 por estudante, em 2003), mas são valores inferiores aos pagos pelo Fundef.

Subestimado
O número de matrículas "cassadas" é pequeno se comparado ao total de estudantes do fundamental em 2003: 31,1 milhões. O MEC calcula, no entanto, que o número de alunos indevidamente contados está subestimado.
Isso porque não há estrutura para visitar todas as 212 mil escolas do Brasil a fim de conferir os dados informados. No ano passado, o MEC fez auditoria em 3.222 estabelecimentos de ensino, o que representa 1,5% do total.
Para Dirce Gomes, diretora de Estatísticas da Educação Básica do Inep, o governo tem buscado aprimorar os mecanismos de controle das fraudes e erros no censo, mas o melhor controle é feito pela própria sociedade.
"Alunos contados a mais significam recursos desperdiçados. O MEC distribui os livros didáticos, por exemplo, de acordo com o número de estudantes que consta do censo. Se alunos da rede de jovens e adultos estiverem matriculados no ensino fundamental, eles receberão um material que não é adequado para a sua idade", afirma Dirce Gomes.
Segundo ela, as denúncias da sociedade são um importante mecanismo para detectar fraudes ou erros. O Inep faz auditoria numa amostragem de escolas de todas as capitais, nas cidades onde houve problemas em anos anteriores e nos municípios denunciados ao MEC por professores, vereadores ou por qualquer outra pessoa.
Os números podem também ser contestados pelos próprios Estados e municípios que verifiquem alguma incorreção na divulgação dos dados preliminares, feita em agosto com esse objetivo. Após as auditorias do Inep e a análise dos recursos dos Estados e municípios, o ministério define o número oficial de matrículas que servirá de referência para o repasse de recursos no ano seguinte.
A partir de janeiro, os dados só podem ser alterados por determinação do TCU (Tribunal de Contas da União) ou pela Justiça.
Neste ano, uma das disputas judiciais previstas envolverá a Prefeitura de Cuiabá. O secretário municipal da Educação, Carlos Alberto Maldonado, diz que entrará na Justiça por causa da perda de R$ 2,5 milhões na receita após as mudanças no censo.
Além de questionar supostos erros da auditoria, Maldonado toca numa questão que é das mais polêmicas: a matrícula de jovens e adultos no ensino fundamental.
"Em 1999, por orientação da Secretaria da Educação do Mato Grosso, os municípios passaram a matricular alunos da rede de jovens e adultos no ensino fundamental. Se você tirar esses alunos do cálculo do Fundef, prejudicará seu município", diz Maldonado.


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