|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RESENHA
Livro sofisticado para um público seleto
CAIO ROSENTHAL
Desde a origem do HIV até os
filmes temáticos premiados
com o Oscar, passando por áridos
conceitos de imunopatologia, nada escapou ao autor de "A Aids".
O tema foi integralmente abordado e em todos os detalhes, o que
não é tarefa fácil. Mas a linguagem, às vezes, é cansativa; afinal,
tornar o tema agradável ou uma
leitura gostosa desvirtuaria o propósito de Marcelo Soares.
Para quem busca um conhecimento mais profundo, sério, sem
sensacionalismos, ao contrário,
baseado na literatura científica e
no compromisso com a verdade,
esse livro torna-se obrigatório.
Despretensiosamente falando,
poderia facilmente estar nas prateleiras universitárias.
No capítulo "O que é Aids", já
percebemos o elevado nível a que
o autor se propõe, e ele deixa
transparecer, pelo menos aqui,
seu poder de síntese. Às vezes, em
outros capítulos, não consegue.
Os dados epidemiológicos são
pontualíssimos. A Aids no Terceiro Mundo é abordada de forma
adequada, mas o autor é um tanto
zeloso ao fugir de comentários
políticos. Poderia, por exemplo,
deixar mais claro ao leitor as razões dos abismos entre Primeiro e
Terceiro Mundos. Tornaria menos árido se abordasse com mais
entusiasmo as causas sociais.
Em contrapartida, talvez denunciando excesso de academicismo, em alguns itens parece
exagerar em dados, por vezes desnecessários. Exemplo: o capítulo
"De onde vem o vírus da Aids"
nos dá impressão de que o autor,
entusiasmado, viajou junto com o
vírus a longa trajetória desde o
chimpanzé até a corrente circulatória do homem. Para o leitor comum, é enfadonho, para o médico generalista, um prato cheio.
O grande mérito do autor é a
clareza e a facilidade com que decodifica informações úteis para
todos. No capítulo sobre transmissão e prevenção, essa tarefa é
cumprida com louvor. Torna-se
conciso, completo, nada escapa
sobre tudo que precisamos saber.
Em "Tratamento e vacinas",
deixa sua marca de forma inequívoca, ao tratar o assunto com o rigor e a seriedade merecidos. É paciente, didático, envolve o leitor,
torna até familiar termos e conceitos nunca ouvidos. Terminada
a leitura, o leitor está apto a ser sabatinado em qualquer banca que
exija elevado conhecimento.
Termos como "quasispécies",
"picos de viremia", "viremias indetectáveis" e tantos outros não
constam do glossário, mas também seria impossível entupi-lo
com todos. Todavia, quase como
quem conta uma história, o autor
pode prescindir de tantas explicações porque dá conta de passar
para o leitor a conceituação necessária que cada termo exige.
O livro tem o mérito de desmitificar naturalmente conceitos antigos e preconceitos, apenas guardando o compromisso exigido
em razão da sua seriedade. Polemiza quando precisa. É, digamos,
politicamente correto, mas escorrega, por exemplo, quando usa o
termo "aidético", execrado entre
os ativistas e os mais engajados.
O livro a meu ver, não se pode
dizer que é básico, vai um pouco
mais além. Não deve, por exemplo, ser adquirido em uma banca
de jornal, mas sim, constar nas
boas livrarias e, quem sabe, até em
bibliotecas universitárias para
pesquisas. O público alvo é o universitário, ou um público exigente, instruído e para quem gostaria
de saber um pouco além daquilo
que seria o obrigatório.
Caio Rosenthal, 52, é médico infectologista e conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo.
"A Aids" (Coleção "Folha
Explica")
Autor: Marcelo Soares
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 9,90 (112 págs.)
Texto Anterior: Estudo se baseou em 4 pesquisas Próximo Texto: Há 50 anos Índice
|