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Sala de velório vira biblioteca em SP
Projeto levará 2.000 livros para o cemitério São Luiz (zona sul) e alfabetizará coveiros; inauguração será no Dia de Finados
Para professora de arquitetura e urbanismo da USP, projetos como esse podem colaborar para reduzir a criminalidade
DANIELA ALARCON
PAULO HENRIQUE RODRIGUES
RICARDO VIEL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Brás Cubas e suas memórias
póstumas estarão no cemitério
São Luiz, na zona sul de São
Paulo. A "autobiografia" do defunto-autor, escrita por Machado de Assis, faz parte do
acervo de uma biblioteca que
será inaugurada, no Dia de Finados, em uma sala de velório.
A Biblioteca do Além -como
foi batizada pelo geógrafo Aziz
Ab'Sáber (leia entrevista nesta
página)- surge improvisada
em 14 m2, mas já abriga 2.000
livros.
O espaço logo ficará pequeno. Doze pessoas, entre jardineiros e coveiros, já se inscreveram para o curso de alfabetização que será oferecido pela
PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) no cemitério.
"Uns cinco colegas meus não
sabem ler. Eu me sinto mal, um
pouco responsável por isso",
diz o coveiro José Francisco da
Silva, 52, que é alfabetizado.
José Nelson da Silva, 46, sepultador -é assim que eles se
autodenominam- é um dos futuros alunos. "Passamos o dia
todo aqui no cemitério. Será
ótimo ter um lugar para ler."
Ele não concluiu o ensino
fundamental, sabe ler "só um
pouquinho", mas adoraria folhear jornais e revistas, algo
que o orçamento não permite.
"Garis, coveiros, eles são invisíveis para a sociedade, mas
exercem um trabalho muito
importante", diz Devanir
Amâncio, presidente da ONG
Educa São Paulo, que atua na
criação da biblioteca.
O espaço de leitura será mais
um atrativo para o cemitério,
que, por lembrar um jardim, é
usado como parque nessa região de poucas praças. Marcada
por um processo de ocupação
desordenada, a região do Jardim São Luiz abriga moradores
com baixos níveis de escolaridade e renda, expulsos da região central.
Para Sheila Ornstein, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, projetos como o da biblioteca podem colaborar para reduzir a
criminalidade.
A biblioteca ainda facilitará
os estudos da auxiliar de limpeza do cemitério Maria Mascilene Nascimento, 35. Aluna de
um curso técnico em enfermagem, quando precisa pesquisar,
é obrigada a trocar os livros pelo computador. "Toda esquina
tem uma lan house, mas biblioteca é difícil por aqui", diz.
Ornstein concorda. Para ela,
as dimensões da cidade tornam
necessário haver mais centros
culturais de pequeno porte distribuídos nos bairros.
Procurada pela Folha, a Secretaria Municipal da Cultura
informou que a prefeitura não
possui levantamento das bibliotecas comunitárias. Tampouco há políticas de auxílio ou
parceria com essas iniciativas.
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