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São Francisco Xavier vive "crise" da água
Sabesp tenta tratar água suja, mas moradores reclamam de "gosto de cloro" e dizem ter perdido sua "maior riqueza'
Problema é atribuído a desmate em fazenda por onde passa rio que abastece distrito turístico da região de São José dos Campos
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL
MARIANA BARROS
ENVIADA A SÃO FRANCISCO XAVIER
Primeiro, a água saiu escura,
quase negra. Depois, nenhuma
gota nas torneiras. Gisele Fátima França, 27, não teve escolha: fechou seu restaurante e
contabilizou os prejuízos. Foram dois dias de espera até que
o abastecimento se normalizasse e a água voltasse a ter a
aparência cristalina típica das
nascentes da serra da Mantiqueira.
Moradora de São Francisco
Xavier, distrito turístico de São
José dos Campos que a fica a 97
km de São Paulo e área de proteção ambiental, Gisele foi uma
das que sofreram com a água
suja e com a falta dela no início
de outubro. A normalização do
abastecimento, porém, não
acabou com os problemas.
"Tive de colocar filtro em casa. Está com gosto de cloro. Antes dava para pegar da torneira
e beber na mão, era nossa
maior riqueza", reclama Gisele.
O gosto ruim tem motivo: para garantir qualidade mínima, a
Sabesp (empresa de saneamento básico de SP) aplicou o mesmo tratamento dado à água retirada do rio Paraíba do Sul, um
dos mais poluídos do Estado.
Típico paraíso ecológico protegido pelo difícil acesso, São
Francisco Xavier vive do turismo, prejudicado porque o lugarejo perdeu a fama de ter "água
mineral" direto da torneira,
afirmam seus moradores.
"Pus a água no balde branco e
vi que estava amarela. A sujeira
do mato assentava embaixo,
como polvilho", lembra o açougueiro José Antônio dos Santos, 41, também do distrito. "A
gente não tem dinheiro, mas tinha água. Era a melhor coisa
que a gente tinha", diz Santos.
Apesar de a investigação sobre o fim da "água mineral" ainda estar em andamento, moradores dizem que a causa foi a
grande quantidade de terra levada pelas chuvas ao rio das
Couves, onde a Sabesp capta a
água para abastecer o distrito.
A vegetação que fixava essa
terra ao solo foi extraída pelo
proprietário da fazenda cortada pelo rio, Walter Cerigatto
Costa. Ele contava com autorização do DEPRN (Departamento Estadual de Proteção de
Recursos Naturais) para cortar
118 hectares (quase um parque
Ibirapuera, em São Paulo) de
"Pinus elliottii", espécie de pinheiro, de sua propriedade.
Ele poderia cortar 20% da
área por ano. Uma vistoria realizada por órgãos do Estado
após as denúncias, porém,
apontou que, até outubro, metade da área já havia sido devastada. O proprietário também
devastou o chamado "sub-bosque", que estava sob o pinus,
quando a licença concedida pelo DEPRN tinha como objetivo
recuperar a mata nativa.
"A retirada foi malfeita, havia
troncos empilhados, muita madeira tombada sobre o rio da
Couves", afirma o engenheiro
Francisco Godoy, chefe da Divisão de Controle Ambiental da
Secretaria do Meio Ambiente
de São José dos Campos.
De acordo com o Ministério
Público, além do pinus, foi extraída também parte da vegetação nativa em estágio inicial de
regeneração, que protege a serra da Mantiqueira.
O conflito entre o fazendeiro
e os moradores de São Francisco Xavier ganhou ares de Velho
Oeste. Insatisfeita, a população
local chegou a espalhar cartazes pelo distrito estampando a
foto do fazendeiro com os dizeres "Persona non grata", culpando-o pela situação da água.
Para Fabiano Lima, presidente da SAB (Sociedade Amigos de Bairros), o maior problema foi a falta de fiscalização do
poder público. "Se não fosse pelo desmatamento, isso não teria acontecido. Isso nunca
aconteceu antes", afirma Lima.
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