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São Paulo, sábado, 08 de fevereiro de 2003

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LETRAS JURÍDICAS

Parlamentares empossados: crimes e infidelidade

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Este pode ser "um país no qual o dinheiro compra indi-cações para cargos de alto escalão, onde os ricos rotineiramente subornam parlamentares e onde a apatia dos eleitores está aumentando". A frase entre aspas pode corresponder a coisas que acontecem no Brasil, mas seu autor é o filósofo Richard Rorty, professor da Universidade de Stanford, escrevendo domingo último no suplemento Mais!, desta Folha, sobre causas de orgulho e vergonha do povo norte-americano.
Servem para introduzir a discussão sobre a posse dos novos parlamentares brasileiros, com a volta de políticos cassados, dos acusados de crimes graves, dos eleitos mediante fraude eleitoral, do súbito inchaço da bancada governista, com a mudança de partidos dos interessados em receber benesses do poder. Comecemos pelo troca-troca de "camisas", pouco ético, mas comum no telhado de vidro da pouca-vergonha partidária. Reabre a discussão sobre a fidelidade do político ao programa do partido e do direito que a deve regular, a contar da certeza constitucional de que todo o poder pertence ao povo.
A vinculação é óbvia: o poder de escolha é exercido, nas eleições, através de candidatos imprescindivelmente vinculados a partidos. Se a soberania popular exerce o voto no candidato fulano, pertencente ao partido tal, é evidente que, se ele muda de partido, trai o eleitor, mesmo em se sabendo da pobreza das idéias veiculadas em tais agremiações. Aquele que se bandeia de um lado para outro deveria perder a cadeira.
Perderia, porém, se, no regime brasileiro, houvesse a obrigação da fidelidade partidária, ressalvadas só limitadíssimas exceções. Fidelidade partidária é quesito fraco na lei e na prática. Há partidos que só significam alguma coisa pelo preço da legenda eleitoral. Poderíamos até mudar a grafia para pre$$o. A fidelidade, se vigente, seria um princípio moralizador capaz de resguardar o respeito ao eleitor, valorizando a opção de cada um.
A segunda questão se desdobra em duas partes: a de reeleitos, depois de cassados (ou salvos pela renúncia), e a de eleitos mediante falsidade na declaração do domicílio eleitoral, acusação feita obviamente a candidatos do Prona. A primeira alternativa (cassados reeleitos) distingue o que no catolicismo se denominam pecados veniais e pecados mortais. Aqueles são "pecadinhos" menores, servindo de exemplo a revelação do voto pelo processo eletrônico.
Incluem-se na segunda espécie ("pecadões", portanto) os do deputado Pinheiro Landim (sem partido-CE), cuja cassação por seus pares, que eles raramente concedem, foi burlada pela renúncia e pela nova eleição. Nesse segundo caso, a reeleição pode afrontar (e não confirmar) o poder de todo o povo, porquanto o parlamentar vota em leis aplicáveis a todos os cidadãos, não apenas aos que o elegeram.
Se um dos candidatos -ou mais de um, dentre os eleitos em São Paulo- tem residência fixa fora deste Estado, não pode ser favorecido por sobras partidárias, aparentando representar o povo paulista que não o poderia eleger, ante a vinculação do eleitor ao domicílio eleitoral de seu Estado, salvo nas eleições presidenciais.
São alguns dos temas a serem enfrentados pela cidadania, com coragem. O povo tem o dever de empenhar-se, através de seus grupos de pressão, segundo as convicções de cada um, para que a justiça do voto seja implantada.


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