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Glicose baixa aumenta risco cardíaco em diabéticos tipo 2
Pesquisa mostra que redução acentuada de açúcar no sangue pode causar infarto
Estudo dos EUA surpreendeu a comunidade científica, que acreditava
que manter a taxa de glicose bem reduzida era benéfico
ao coração
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um estudo com 10 mil diabéticos tipo 2, conduzido por um
órgão de saúde do governo norte-americano, mostrou que reduzir muito a taxa de açúcar no
sangue pode aumentar o risco
de morte por eventos cardíacos, e não preveni-los, como se
pensava. Estima-se que no Brasil haja 11 milhões de diabéticos, a maioria tipo 2 (o país tem
190 milhões de habitantes).
No estudo "Accord", o maior
do gênero já feito, um grupo de
diabéticos teve o controle glicêmico mantido (por remédios)
na taxa média de 6,4% (de hemoglobina glicada, que reflete o
grau de controle da glicemia
nos últimos três meses). No outro, a taxa média foi de 7,5%.
Verificou-se que no primeiro
grupo morreram 54 pacientes a
mais do que no segundo.
Em razão do aumento inesperado de mortes, os pesquisadores interromperam parte do
estudo que envolvia o controle
glicêmico mais intenso e que
seguiria até junho de 2009.
Hoje, a maioria dos consensos médicos, inclusive brasileiros, preconiza uma taxa média
de hemoglobina glicada de
6,5%. Os resultados surpreenderam a comunidade científica.
"Por anos nós temos falado sobre os benefícios de se manter
as taxas de açúcar muito baixas", afirmou à Folha James
Dove, presidente do Colégio
Americano de Cardiologia.
Pressão da indústria
Segundo o cardiologista
Bráulio Luna Filho, da sociedade paulista de cardiologia e
conselheiro do Cremesp (conselho regional de medicina
paulista), até hoje, pensava-se
que um controle glicêmico rígido poderia reduzir o risco de infartos. "Esse estudo, muito
bem-feito, demonstra que esse
raciocínio não funciona mais."
Para ele, há hoje uma crescente pressão da indústria farmacêutica para vender drogas
que reduzam cada vez mais os
índices glicêmicos.
"Muitas vezes os valores de
normalidade entram na prática
médica sem ter muito estudo
mostrando a eficácia e a segurança disso. Os laboratórios
usam dados favoráveis de estudos envolvendo análises de
subgrupos [de pacientes envolvidos em estudos maiores] para
vender remédio."
Luna Filho diz que até agora
o único risco conhecido de um
controle glicêmico mais agressivo era a hipoglicemia -taxa
de glicose no sangue abaixo da
normal que pode resultar em
sensação de fraqueza, cansaço,
sudorese exagerada e até perda
de consciência. "Ninguém nunca tinha demonstrado o risco
de mortalidade."
Para o endocrinologista da
Unicamp Marcos Tambascia,
da Sociedade Brasileira de Diabetes, o estudo não deixa claro
se todas as variáveis para riscos
cardiovasculares, fora o nível
glicêmico, foram bem controladas. Luna Filho, que teve acesso à integra do estudo, diz que
houve esse cuidado.
"A chance de uma pessoa ter
um infarto depende de vários
fatores, um deles é o controle
da glicemia. Mas depende também da pressão arterial, do peso, do colesterol, se é fumante
etc. Não sabemos ainda se esses
outros fatores foram bem controlados, apesar de ser um estudo muito sério."
Ele acredita que a maioria
dos médicos brasileiros evita
reduzir muito os níveis glicêmicos dos diabéticos por conta
do risco de hipoglicemia. "No
paciente que usa insulina, por
exemplo, quanto mais baixa a
glicemia, maior é o risco de hipoglicemia." Por isso, diz ele, os
médicos não preconizam um
controle glicêmico rigoroso em
crianças e idosos, por exemplo.
Ele recomenda que os pacientes não interrompam ou
mudem o tratamento sem recomendação médica. O descontrole glicêmico no paciente diabético leva a complicações como cegueira e amputações.
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