São Paulo, domingo, 8 de fevereiro de 1998

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Empresários vêem honestidade no policial que tem segundo emprego

da Reportagem Local

Apesar de proibido pela Lei Orgânica da Polícia, o segundo emprego é bem visto entre os policiais. Dos nove policiais ouvidos nesta reportagem, só um admitiu que tem outra atividade, mas quatro disseram que o segundo emprego sinaliza que o policial não está praticando corrupção.
O consenso entre os últimos é que o salário de policial não permite uma vida digna.
David dos Santos Araújo, delegado do Deplan (Departamento de Planejamento e Controle) da Polícia Civil: "Eu trabalho para a Osvil. Quando posso, trabalho para a Osvil, como neste instante, por exemplo. A lei proíbe que você pratique atos de gerência. Eu, por exemplo, não assino nada. Eu considero (esse serviço) relativo ao ensino. Eu, desde que entrei na polícia, em 1965, aprendi uma coisa: que o ordenado da polícia não é, infelizmente, suficiente para o camarada viver com dignidade. Nunca na minha vida respondi a uma sindicância ou a um processo administrativo, um processo judicial de dinheiro, bola. Porque a vida toda eu sempre fiz alguma coisa paralela à polícia na minha hora de folga."

Jorge Elias Francisco, delegado do 55º DP: "Sou sócio-cotista. A lei permite que a pessoa tenha ações de uma empresa. Eu não trabalho na minha empresa, quem administra é meu irmão."
Sobre o conflito ético entre segurança privada e pública: "São coisas distintas. A polícia presta um serviço de segurança das vias públicas, dos locais públicos, e a empresa de segurança presta serviço em áreas particulares."
Sobre o segundo emprego entre policiais: "Se o policial está exercendo uma atividade fora da polícia é sinal que ele não está praticando atos de corrupção. Eles são mais bem vistos porque se presume que sejam policiais honestos."

Antonio da Costa Pereira Neto, delegado do IIRGD (Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt): "Sou proprietário. Não estou infringindo a lei porque a própria lei orgânica me faculta ser sócio-cotista. Não posso ser sócio-gerente. Quem toma conta daquilo é minha mulher e meu cunhado."
Sobre o conflito ético entre segurança privada e pública: "Nenhum problema ético, mesmo porque eu nem participo da administração."
Sobre as facilidades que um delegado pode trazer à sua empresa de segurança: "Eu acho que a existência de um delegado entre os sócios facilita a obtenção de clientes, porque na verdade é um profissional de segurança. Sempre você tem uma indicação."

Everardo Tanganelli Junior
, delegado do Denarc (Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos): "Eu posso ser dono de empresa, não só de segurança, mas de qualquer empresa, como acionista ou cotista. Minha mulher saiu da Defender em dezembro do ano passado. Saiu porque a maioria dos delegados envolvidos em empresas de segurança já foi convocada pela Corregedoria para dizer qual era a participação. Não tem nada a ver, mas achei melhor ela sair para evitar complicação. O policial hoje precisa ter um outro tipo de serviço, um ganha-pão honesto. Na empresa, eu nunca trabalhei, mas prestava assessoria e ainda presto. Dou curso de tiro. Isso não compromete minha atividade de policial."

José Roberto de Arruda, delegado do Denarc: "Minha esposa foi sócia da Defender, mas saiu há pouco tempo. Eu não tenho a menor participação nesta empresa. Você pode ligar lá, perguntar por mim, você não vai me encontrar nunca. Muita gente coloca o nome da esposa para sair fora. Não era o meu caso. Não participava da direção e não tinha qualquer vínculo empregatício com a empresa. O que eu fazia era visitar minha esposa esporadicamente, quando a empresa estava no início."

Sérgio Olímpio Gomes, capitão da Polícia Militar: "Olha, minha esposa realmente é sócia-gerente da empresa. Eu não tenho qualquer tipo de participação na administração ou nas operações da empresa. A única coisa que eu faço ali, e que a legislação me permite, é dar instrução de tiro e treinamento. Eu tenho um regime de expediente na escolta do ex-governador Fleury que não me permite exercer qualquer carga horária ou atividade paralela ao serviço policial. Os cursos que dou são durante a noite ou nos fins-de-semana."
Sobre a informação apurada pela Folha de que o capitão teria negociado a data de pagamento do 13º salário com vigilantes: "De forma nenhuma. Quem trabalha e conduz os negócios da empresa é o coronel Ubiratan (Guimarães) e o Álvaro Parreira, que são sócios da minha esposa. Eu não exerço atividade dessa natureza."

Délcio Silmar Sampaio, delegado que assessora a Assembléia Legislativa: "Participo da administração nas minhas horas de folga, ajudando minha esposa. Sou sócio-cotista e a Lei Orgânica da Polícia permite isso. Não uso de expedientes escusos da polícia, como muitos colegas fazem. Não me prevaleço do cargo. Sempre tive uma segunda atividade. Se eu tivesse entrado na polícia com salário de policial americano ou francês, não teria a empresa. Mas com o que ganho -R$ 3.600- não dá. Tem de ter uma segunda renda."

Paulo Sérgio Oppido Fleury
, delegado do Depatri (Departamento de Investigações sobre Crimes contra o Patrimônio): indicou Paulo Esteves, advogado. Esteves: "Eu só terei interesse nessa notícia depois de ela ser publicada. Tudo que ela contiver, eu, advogado, não posso me manifestar hoje porque amanhã eu posso estar sendo chamado a mover alguma ação com relação a ela, se isto for necessário. Então, como é que eu vou falar consigo a respeito de um assunto que amanhã ou depois eu posso estar profissionalmente ligado? Como vou ser parte eventualmente nisto, não posso hoje lhe dizer nada a respeito."

Joffre Belfort de Andrade Sandin, delegado da Corregedoria da Polícia Civil: "Eu estou proibido de dar entrevistas pela portaria número 30 do delegado-geral. Para ter qualquer informação sobre esse assunto, você deve ligar para o meu advogado, Paulo Esteves."
Esteves: "Não quero me manifestar sobre tudo aquilo que o senhor vai fazer. Não costumo dar entrevistas porque acho que meu código de ética proíbe isso."
Sobre o fato de Belfort ser agente de segurança pública e ter uma empresa de segurança privada: "Ele (Belfort) não tem nada a falar a respeito dessa matéria. Tudo o que eu fiz foi ver na legislação se existe vedação de a pessoa ser proprietária de uma empresa. Não existe essa vedação."




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