São Paulo, quinta-feira, 08 de março de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PASTORAL DA CRIANÇA

Para a candidata ao Prêmio Nobel da Paz deste ano, público feminino é o principal agente da transformação social

Zilda Arns quer que mulher "arregace as mangas"

CÉLIA CHAIM
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma das mulheres brasileiras mais cortejadas neste momento é a pediatra e sanitarista Zilda Arns Neumann, 66, mãe de cinco filhos, avó de sete netos, nascida em 1934 em Forquilhinha (SC), fundada por seu pai, Gabriel Arns.
Zilda, fundadora e coordenadora nacional da Pastoral da Criança, organismo de ação social da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, é idolatrada por pelo menos 1 milhão de famílias assistidas pela Pastoral no país.
Graças a seu trabalho e de 150 mil voluntários, a Pastoral conseguiu reduzir a mortalidade infantil a menos da metade da média nacional entre as crianças por ela acompanhadas em todo o Brasil. Segundo o Unicef, a taxa de mortalidade infantil no país em 1999 foi de 34,6 mortes para cada mil crianças nascidas. Entre as crianças da Pastoral, a taxa é inferior a 17. Por fazer o que nenhum governo conseguiu, Zilda pode ganhar, em setembro, o Prêmio Nobel da Paz, representando a Pastoral.
Ela tem 12 irmãos. Um deles é dom Paulo Evaristo Arns. Para ela, no trabalho da Pastoral a mulher é a verdadeira rainha do lar. Rainha pobre, que luta pela comida dos filhos e que tem capacidade para transformar a família e a comunidade. Mais de 90% dos agentes da Pastoral são mulheres, que hoje comemoram o Dia Internacional da Mulher. "Elas têm uma inteligência mais difusa, enxergam mais e deveriam ser homenageadas todos os dias do ano", disse à Folha.

Folha - A sra., que convive com crianças necessitadas, como vê a situação das mães dessas crianças?
Zilda Arns -
Eu vejo a mulher hoje como o agente principal da transformação do país. Ela tem baixa auto-estima, baixa escolaridade, é oprimida. Fortalecendo o tecido social, a comunidade se torna mais poderosa e o poder público mais facilmente leva a ela projetos de saúde, educação, alimentação etc. A grande arte da Pastoral é fazer com que as mães se motivem, cuidem melhor das crianças e os governos respeitem as comunidades.

Folha - É possível recuperar a auto-estima de uma mulher que vive nas pior condição social?
Zilda -
A Pastoral começa pelos líderes comunitários para alcançar as mães. Temos cerca de 150 mil líderes de comunidades em situação de miséria e esses líderes multiplicam o saber e a informação. As líderes fazem um milhão de visitas ao mês, levando a um milhão de mulheres algumas coisas sobre auto-estima, cidadania, relações humanas.

Folha - A sra. encontra muitas mulheres chefiando a família?
Zilda -
Tem muitas. Há pesquisas demonstrando que isso aumentou muito nos últimos anos. O marido sai atrás de emprego, arranja outra mulher, e a mulher fica com as crianças. Creio que de cada 10 famílias, em pelo menos três a chefe é a mulher.

Folha - E as crianças, como ficam quando a mãe vai trabalhar?
Zilda -
Num país como o Brasil é difícil para a mulher pobre exercer o papel de mãe. Para trabalhar, ela às vezes deixa as crianças amarradas no pé da mesa. Agora, quando você tem líderes comunitários que estão vigilantes, a própria comunidade discute e acha seus caminhos.

Folha - O que a sra. pensa sobre o futuro da mulher brasileira?
Zilda -
Os indicadores de rapazes e meninas que terminam o segundo grau e a universidade mostram que o número de mulheres é maior que o de homens. Isso é muito bom, especialmente porque quanto mais a mulher estuda menor é a mortalidade infantil.

Folha - O que a sra. diria às brasileiras no Dia Internacional da Mulher?
Zilda -
Mulheres, vocês são a esperança do Brasil. Arregacem as mangas, ponham a mão na massa da construção de uma sociedade justa e dêem a mão para as crianças carentes.



Texto Anterior: Velório na TV inicia criança no ritual da morte
Próximo Texto: Violência: Protesto de preso provoca 2 mortes no Rio
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.